É coragem que se chama né? Quando alguém resolve fazer uma minissérie minissérie baseada em Gêmeos - Mórbida Semelhança (1988) um dos melhores filmes de David Cronenberg, pois Alice Birch (também produtora de Normal People/2020 e Lady Macbeth/2016) resolveu adaptar a obra para uma produção de seis capítulos para o Prime Video. Se a ideia desperta desconfiança, ela logo se dissipa quando vemos Rachel Weisz encarnando as gêmeas Elliot e Beverly massacrando um sujeito que revela suas fantasias com as duas. A cena é um recado aos fãs do filme que brincava com essas fantasias enquanto os gêmeos (com mesmo nome) vividos por Jeremy Irons nutriam uma estranha relação. Aqui a produção não apenas muda o sexo dos protagonistas, como também a profissão. Se antes eles eram ginecologistas, agora elas são obstetras. A trama insere novas camadas ao explorar a ascensão de ambas na construção de uma clínica (que depende do investimento de um grupo de ricaços tão esnobes quanto excêntricos liderados por Jennifer Ehle), que se torna uma referência ao atendimento e pesquisas sobre gravidez. Mais do que partos e inseminações, as ideias da desinibida Elliot beiram o surreal em alguns momentos, enquanto Beverly quer o sossego do relacionamento com uma atriz famosa, Genevieve (Britne Oldford em uma personagem que carrega o nome da atriz do primeiro filme). Weizs vive as duas personagens com uma grande habilidade (sendo contida e problemática na pele de uma, sendo caricata e complicada como a outra) e com surpreendente bom humor. Humor é o que não falta nesta releitura e se torna um grande diferencial com relação ao filme que investia em doses mais fartas de estranheza e luxúria. A estrutura em capítulos também ajuda bastante a trama, conforme os episódios avançam, conhecemos um pouco mais da história das duas e as pessoas que gravitam em torno delas, mas sem perder de vista o relacionamento doentio entre elas. Existe aqui um verdadeiro desfile de temas como maternidade, infertilidade, a sororidade, envelhecimento, identidade, ambição e princípios que são desenvolvidos de forma bem diferente do que costumamos assistir, principalmente pela dualidade instaurada entre as protagonistas. Para fugir do óbvio e dizer que o destaque fica por conta do trabalho de Rachel Weisz, destaco o denso trabalho da criadora para provocar estranhamento a cada episódio e a direção de arte, que compõe uma clínica com muito uso de vermelho (outra referência ao filme) que lembra o tempo inteiro que o sangue vai rolar.
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