Madeline e Callan: como tornar-se gente grande.
Faz um tempo que li na Internet sobre o novo filme de Rob Reiner (diretor de pérolas como Conta Comigo/1986 e Harry & Sally/1989, mas que nos últimos anos se rendia ao mais trivial feijão com arroz). Lembro que a premissa me parecia interessante e o nome curioso (Flipped) me deixava instigado ao revisitar um subúrbio americano na década de 1960. Apesar dos elogios acalorados o filme acabou fracassando nos cinemas americanos e chegando aqui em poucas locadoras que acreditavam no potencial do filme. Com o pouco sugestivo nome de O Primeiro Amor, quem se aventurar em assistí-lo terá uma grata surpresa. Numa primeira olhada o filme parece mais um daqueles romances pré-adolescentes artificiais e sem sal, mas aos poucos ganha corpo de um filme bastante interessante. Pra começar Reiner utilizou um recurso já gasto de narrativa (contar as situações sob a perspectiva do garoto e depois conta a mesma situação pelos olhos da garota), mas que resulta sempre interessante quando o roteiro sabe ser sincero e consegue equilibrar os dois lados da questão. Retomando seu dom em trabalhar com adolescentes (como no aclamado Conta Comigo) o diretor conta o romance que brota entre os jovens Julie Baker e Bryce Loski (vividos pelos ótimos Madeline Carroll e Callan McAuliffe). Na verdade, um amor que se anuncia na infância, quando a família Loski torna-se vizinha da família Baker. Desde aquele dia, onde era só uma menininha, Julie anunciava para si que seu primeiro beijo seria de Bryce. O mais bacana do roteiro é como ele mostra para a garota que a coisa não é tão simples como a infância anuncia. Quando estão mais crescidos, cursando o sexto ano, a distância entre os dois personagens só tende a aumentar - e por isso o recurso de alternar o olhar de um e do outro é tão válido. São nas impressões (e reflexões) de ambos sobre os fatos que os cercam que começam a perceber o outro de uma nova forma. Se Julie desde o início não consegue esconder seus interesses pelo vizinho, aos poucos percebe que ele não é tão perfeito quanto imaginava - sendo sempre capaz de desapontá-la em situações capazes de partir o coração de um ogro. Por outro lado, Bryce se esquiva daquela menina que sempre o persegue e que considera esquisita (ela cria galinhas, o quintal dela é pouco cuidado e até se manifesta contra o corte de uma árvore da vizinhança), mas que nem faz ideia o quanto a admiração dela lhe é importante. Além de Callan e (mais ainda) Madeline darem conta do recado com muita competência, eles recebem o apoio de veteranos sumidos. Julie tem como pais Aidan Quinn e Penelope Ann Miller, enquanto Bryce é filho de Anthony Edwards e Rebecca DeMornay, e todos eles apresentam atuações críveis, sem exageros, num texto que trata seus personagens com muita esperteza e que não se esquiva de explorar os conflitos que surgem entre a "educação" dos humildes Baker e os esnobes Loski. Soma-se a esse universo o vovô Loski (John Mahoney) e os irmãos cantores da família Baker (Shane Harper e Michael Bolten) e o resultado é dos mais simpáticos. Como deu para perceber, visto de perto, o filme deixa de ser apenas sobre o romance dos personagens e se amplia para temas mais ricos, como a passagem para a fase adulta - especialmente aquele momento em que começamos a dar conta da realidade que nos cerca, os conflitos familiares, os preconceitos e discordâncias de um universo que antes mostrava-se tão acolhedor e seguro. É impossível não se identificar com os momentos em que o casal de adolescentes começa a questionar a lógica que regem suas família e tudo que era aceito com naturalidade (o quintal abandonado, um tio com problemas mentais recluso, os presentes jogados fora, a tirania de um pai) passa a ser alvo de reflexões. O final é doce e nostálgico na ideia de que Julie & Bryce finalmente se entenderam e que aceitaram os sentimentos que um tinha pelo outro, mas ainda deixa aquela sensação de que aquele momento é apenas um ponto de partida. Como curiosidade, vale lembrar que no livro em que o filme se baseia a história se passava nos dias atuais e não há cinquenta anos. Crescer é crescer em qualquer época.
O Primeiro Amor (Flipped/EUA-2010) de Rob Reiner com Madeline Carroll, Callan McAuliffe, Aidan Quinn, Antony Edwards, Rebecca DeMornay e Pennelope Ann Miller. ☻☻☻ ☻
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