Hütz: fetiches, músicas e filosofices.
Um cineasta estreante que tende a ser mais, digamos, "artístico", costuma embaralhar uma penca de ideias, exagerar na estilística cênica em alguns momentos e costuma até pensar que o público terá a mesma sensação que ele ao ver o filme realizado. Apesar de ter atuado em dezenas de filmes e ter vasta experiência em compor shows e videos, Madonna sucumbe a todos os cacoetes de estreia que mencionei acima em seu longa de estreia. Para falar a verdade Sujos & Sábios não é nem o seu primeiro longa, antes ela havia realizado o documentário sobre o Malaui sob o título I am because We are/2008. Se o documentário bem intencionado não chamou atenção, o oposto aconteceu com sua estreia na ficção - pena que a atenção foi recheada de críticas. Quem conhece a carreira da cantora é capaz de identificar tintas autobiográficas na história dos três amigos que dividem um apartamento enquanto buscam rumos para suas vidas. Um deles é AK (o ótimo Eugene Hütz), um imigrante ucrâniano que tem uma banda de punk rock cigano que busca o sucesso (mas ganha uns trocados satisfazendo as fantasias de marmanjos que gostam de ser submetidos a humilhações) e gosta de divagar sobre o que vê (por isso se considera um sábio). Ele divide o apartamento com Holly (Holly Weston), uma dançarina que precisa de dinheiro e acaba aceitando a ideia do amigo de trabalhar numa boate de striptease. A outra membro do trio é Juliette (Vicky McLure), que trabalha numa farmácia enquanto pensa em ajudar os necessitados nos confins do continente africano. Quem conhece um pouco da carreira da popstar é capaz de identificar traços dela nos três amigos - seu passado como dançarina, a forma como explora as fantasias sexuais de seu público e algum engajamento em causas sociais. Pena que a diretora Madonna não aprofunda as relações entre os personagens, tudo fica na superfície em situações que não possuem muita graça ou apelo na humanização desses sujeitos que poderiam ser até curiosos. Muitas situações que aparecem na tela ficam pelo meio do caminho, como se tivesse medo de mergulhar os três amigos no mundo que os cerca. Mesmo AK que é defendido com a simpatia usual de Hütz poderia ganhar cores muito mais interessantes se fosse aprofundado sua admiração pelo vizinho cego (Richard E. Grant) - que nutre um interesse platônico por ele. Molly também não tem muito o que fazer além de aprender a tirar a roupa para um bando de marmanjos (infelizmente o roteiro ignora solenemente as possibilidades ao lado do dono do inferninho em que vai trabalhar que é vivido por Stephen Grahan e sua instrutora, a sexy Francesca Kingdon que é a cara da cantora Lilly Allen) e Juliette é tão sem graça que suas pendengas com o patrão indiano parece apenas perda de tempo. Apesar de todas as possibilidades, todas ficam pelo meio do caminho no roteiro de Dan Cadan e Madonna tenta disfarçar sua inabilidade em conduzir atores com cenas que parecem clipes (como as fotos fetichistas com uniformes escolares ou o desfecho animado com o Gogol Bordello, a banda de Hütz). O resultado foi tão decepcionante que foi desprezado pelos distribuidores de cinema - de forma que Madonna disponibilizou o filme para download na internet. Acho que nem vale citar aqui os cineastas que Madonna diz servir de referência para sua cinematografia (Visconti? Pasolini? Truffaut? Fellinin? Godard? Onde?!), a estética apresentada aqui está mais próxima dos piores indies ingleses. Se a última empreitada da cineasta Madonna (W.E./2011) merece ser vista pela atuação de Andrea Riseborough, esta primeira aventura tem como maior mérito a presença de Hütz - em mais um bom momento diante das câmeras num personagem totalmente diferente do emocional Uma Vida Iluminada/2005. Quanto ao título do filme, sua sujeira é apenas superficial e a sabedoria também não é o seu forte.
Sujos e Sábios (Filth and Wisdom/Reino Unido-2008) de Madonna com Eugene Hütz, Holly Weston, Vicky McLure, Richard E. Grant e Francesca Kingdon. ☻
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