Addison e Foster: você confiaria seu país a esses caras?
Fazia tempo que não assistia a um filme que abusasse tanto do mais cortante humor britânico e, o mais incrível, dentro de um tema tão delicado quanto as especulações de uma guerra que se aproxima. As piadas e centenas de referências garantiram ao filme uma vaga na corrida pelo Oscar de roteiro adaptado de 2010, onde mostrou-se um verdadeiro peixe fora d'água (já que ninguém esperava sua indicação). Baseado na série The Thick of It, que era produzida e escrita pelo diretor do filme, Armando Iannucci, o longa se mostra uma sátira politicamente incorreta e engraçadíssima sobre as dificuldades de comunicação entre o governo britânico e o americano - acrescida de uma dose cavalar de incompetência. Tom Hollander (aquele baixinho de Orgulho e Preconceito/2005) está hilário como Simon Foster, o Secretário Britâncio de Estado para o Desenvolvimento Internacional, que sente mais necessidade de dizer alguma coisa do que entender sobre o que está falando. Soltando frases sem sentido sobre a eventual possibilidade de uma guerra, ele está no cargo há 48 horas e já é considerado um idiota. Até o fato de ter a eficiente Judy (Gina McKee) e, o nem tanto, Toby (Chris Addison) como assessores não é páreo para suas sandices. A repercussão de suas frases de efeito sem sentido (como "Escalar a montanha dos conflitos") na imprensa repercute no governo americano - que utiliza as declarações boçais de Foster tanto para impedir quanto fazer estourar a guerra. Sem saber muito bem o que está fazendo Foster tem contato com um general (o ótimo James Gandolfini) e a Secretária Assistente para Diplomacia Karen Clarke (Mimi Kennedy) que tentam impedir a guerra por motivos mais econômicos do que pacifistas. No meio dessas intrigas comitês secretos são os alvos dos personagens. No entanto, as falas mais absurdamente divertida são do especulador Malcolm Tucker (Peter Capaldi). Como diria uma amiga, o cara tem que lavar a boca com cloro de tão suja que ela é. Além dos palavrões que jorram ele ainda é capaz de chamar Foster de "Julie Andrews Nazista" enquanto chama o Toby de "Bebê Eraserhead" e Judy de "mulher de Traídos pelo Desejo". A propósito, mesmo com toda eficiência, Judy é seu alvo favorito, sendo suspeita por todos os vazamentos de informação para imprensa e ainda é acusada de achar conduzir o seu trabalho como um livro de Jane Austen - sem falar nas ofensas (que não podem ser escritas aqui) sobre cavalos. Enfim, Tucker é um gentleman [sic] capaz de manipular toda a política para satisfazer seus interesses mais mesquinhos (basta ver sua correria ao final para começar e depois adiar a guerra). Ianucci imprime ao filme uma estrutura bastante similar ao seriado The Office, mas não exagera no tom documental. Nem precisava, existe uma quantidade de cenas tão absurdas no filme que ele já teria graça somente com o texto escrito na tela. A cena de James Gandolfini calculando o número de soldados num computador infantil é de rolar de rir, assim como Foster deitado de gravata e cueca recebendo a visita de Tucker: "Você veio aqui só para me humilhar!", já valeria a visita. Além disso o filme ainda tem a grata surpresa de resgatar Anna Chlumsky, a menina que foi o Primeiro Amor (1991) de Macaulay Culkin, que cresceu e apareceu no papel de uma assessora que ficou marcada por escrever um documento, o PP-PIP ("O que é isso é sobre pássaros?", pergunta um personagem), que pode estragar qualquer tentativa governamental de declarar guerra. Com tantos tipos estranhos, os britânicos ganham de lavada em termos de piadas e tropeços governamentais. Divertidamente surreal, In The Loop faz a política deixar de ser coisa séria, mas continuar sendo um campo de jogos de interesses onde o que menos importa é o cidadão comum que vê seu muro desmoronar.
In The Loop (Reino Unido/2010) de Armando Iannucci com Tom Hollander, Peter Capaldi, Chris Addison, Anna Chlumsky, Mimi Kennedy e James Gandolfini. ☻☻☻☻
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