domingo, 8 de julho de 2012

DVD: O Artista

Dujardin e Bejo: homenagem ao cinema mudo.

Em tempos de tantas tecnologias, efeitos especiais e atores que são cada vez mais desvalorizados frente às franquias milionárias é, no mínimo, curioso que a Academia tenha conferido cinco Oscars a um filme como O Artista. Todo mundo deve saber que entre os nove indicados ao prêmio desse ano este  era o único em preto e branco e que reproduz a linguagem do cinema mudo, uma ousadia do cineasta Michel Hazanavicius que chamou atenção assim que foi exibido em Cannes. Bastou o filme ser distribuído nos EUA para ser adorado pelos críticos e pela classe artística. Pode-se dizer que acarretou uma onda nostálgica que culminou na noite de entrega do Oscar com um lobby fortíssimo dos irmãos Weinstein que venderam o filme como uma obra-prima. Nesse processo ajudou um bocado que a Academia tenha um je-ne-sais-quoi pelas produções francesas e estar faminta por um galã do quilate de Jean Dujardin. Apesar de todos os elogios e prêmios, não consigo ver o filme como algo mais do que uma brincadeira com o cinema mudo. É verdade que é belíssimamente produzido, com precioso detalhismo nos figurinos, na trilha sonora, na fotografia, mas toda a originalidade do filme está mais na forma do que no conteúdo, já que as dores da transição do cinema mudo para o falado já foi abordado várias vezes no cinema com maior densidade (como nos clássicos Cantanto na Chuva/1952 e Crepúsculo dos Deuses/1950) e O Artista é até despretensioso na forma como constrói uma comédia romântica neste ambiente. George Valentin é um galã do cinema mudo e acidentalmente acaba descobrindo uma aspirante à atriz que fará muito sucesso. Ela se chama Peppy Miller (a argentina Bérénice Bejo, indicada ao Oscar de coadjuvante) e ascenderá nas telas à medida que o cinema falado ganha espaço e Valentin perde o seu prestígio por considerar os filmes falados uma moda passageira.  Valentin se tornará um astro decante e se encontrará com Miller várias vezes - especialmente quando ninguém mais lembrar dele e Peppy lhe der uma ajudinha. O que deve ter atraído tanta repercussão é a agilidade e simpatia com que Hazanavicius incorpora a época retratada  (entre 1927 e 1932) ao filme  com a ajuda inestimável da patroa (Bejo é casada com o cineasta) e mais ainda de Dujardin. Dizem que o ator tinha fama de canastrão até receber o prêmio de melhor ator em Cannes no ano passado, mas a forma como consegue costurar as pantominas do cinema mudo com os momentos mais dramáticos de seu personagem lhe valeram ainda o Globo de Ouro de melhor ator de comédia/musical, o prêmio do Sindicato dos Atores nos EUA, BAFTA e o Oscar. Houve quem torcesse o nariz para o moço, mas convenhamos que o artista perderia muito se não contasse com o seu carisma (que considero muito semelhante ao de Hugh Jackman). Dujardin não poupa esforços para agradar, dança, sapateia, faz caretas, interpreta com um cachorrinho, ameaça matar-se, sorri, chora e se desespera quando percebe não emitir som. Outro mérito do filme é o roteiro que brinca o tempo inteiro com o fato dos personagens não oralizarem os diálogos - dizem que demorou quatro meses para ficar pronto, ou seja, até atingir o ponto de tornar-se compreensível sem o uso exagerado de legendas. Tantas qualidades resulta numa homenagem engraçadinha ao cinema mudo e que reserva sua ousadia ao formato que poucos topariam em Hollywood - mas que atraiu produtores e atores americanos para a empreitada, portanto, não estranhe as letras e diálogos em inglês. Hazanavicius sabia que esse detalhe faria a diferença perante a Academia.


O Artista (Le Artist/França-Bélgica -2011) de Michel Hazanavicius com Jean Dujardin, Bérénice Bejo, James Cromwell, John Goodman e Penelope Ann Miller. ☻☻☻

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