Dafoe e Brooklyn: o mundo segundo Sean Baker.
Sean Baker dirige desde o ano 2000, mas ficou conhecido quinze anos depois com o lançamento do coloridamente divertido Tangerine. Na prática era como se os primeiros filmes de Pedro Almodóvar fossem trasportados para a Los Angeles do século XXI com as cores de um iPhone 5. Não bastasse este aspecto para entrar para a história, o filme ainda ficou famoso por ser o primeiro a ganhar lançamento comercial mundial e lugar nas premiações tendo duas atrizes transexuais como protagonistas. Era de se esperar que Baker criasse algo ainda mais surpreendente em seu filme seguinte, mas ele preferiu manter o seu foco no que considera mais precioso: as pessoas que não ganham destaque numa tela de cinema. Eu por exemplo não fazia ideia que perto da Disney existia um conjunto de hotéis baratinhos onde vivem pessoas que nem sabem se terão um teto no dia seguinte. Nada mais contundente que Baker volte sua câmera então para crianças que estão pertinho do Mickey e, mesmo assim, dificilmente terão a chance de visitar o mundialmente famoso parque de diversões. É nesta realidade que vive a pequena Moone (Brooklyn Kimberly Pierce) ao lado de sua mãe, a maluquete Halley (Bria Vinaite, descoberta pelo diretor no Twitter). Moone passa a maior parte do dia aprontando com os seus outros amiguinhos de pouco mais de seis de anos e tornam o hotel onde vivem num verdadeiro campo de aventuras. Algumas vezes as situações saem do controle, em outras precisa lidar com a vigilância do zelador Bobby (Willem Dafoe, merecidamente indicado ao Oscar de ator coadjuvante) que tenta deixar aquele lugar decadente com o mínimo de dignidade para os moradores que mal tem dinheiro para pagar o aluguel no fim do mês. Halley se vira como pode, vende perfumes nas ruas, aplica pequenos golpes e toma algumas decisões que podem comprometer a guarda de sua filha... enquanto isso, Moone se torna uma das personagens infantis mais memoráveis do cinema com suas tiradas espirituosas. A pequena Brooklyn é um verdadeiro achado de espontaneidade e eu não faço a mínima ideia se ela está improvisando ou realmente interpretando uma personagem - mas é naquela cena perto do final, que pode mudar sua vida para sempre que aquele aperto na garganta é inevitável. Projeto Flórida não é tão redondo e amarradinho quanto Tangerine, mas parece que a intenção do diretor era realmente explorar o cotidiano sem muita perspectiva, o que torna a narrativa um pouco repetitiva. No entanto, o cineasta deixa evidente, mais uma vez, seu talento para extrair o colorido das locações urbanas, além de demonstrar muito carinho por seus personagens. É de fazer os olhos brilharem quando mãe e filha levam uma amiguinha para uma surpresa no dia do aniversário ou nas cenas em que se torna palpável como Halley ama a filha apesar de todos os problemas que sua vida possa ter. Ao final, temos a sensação que Baker terá uma bela cinematografia calcada em personagens que o cinema costuma deixar de lado, e, o melhor de tudo, filmados por uma lente humanista sem afetações ou discursos intelectualóides.
Projeto Flórida (The Florida Project/EUA-2017) de Sean Baker com Brooklyn Kimberly Pierce, Bria Vinaite, Willem Dafoe, Christopher Rivera, Patti Wiley e Aiden Malik. ☻☻☻
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