Denzel: diluindo nobres convicções.
Faz parte da estratégia dos estúdios guardarem seus filmes para o finalzinho do ano quando os votantes das premiações começam a ficar atentos para os melhores do ano. Imaginam que com uma boa performance recente na memória, determinado filme pode receber mais votos e, quem sabe, até um Oscar. Roman J. Israel, esq. padeceu desta estratégia, sofrendo do efeito colateral de ter pouco tempo para atrair seus futuros votantes - de forma que somente o famoso Denzel Washington foi lembrado nas premiações. No Brasil o efeito é ainda mais sentido, já que os distribuidores sequer chegaram a lançar o filme por aqui, limitando a algumas pré-estreias para poucos curiosos que queriam ver a oitava atuação de Denzel indicada ao Oscar. Escrito e dirigido por Dan Gilroy (bom roteirista que estreou na direção com O Abutre/2014), o filme dividiu opiniões nos festivais em que foi exibido e chamou pouca atenção do público quando estreou nos Estados Unidos, no entanto o filme propõe um estudo interessante sobre um personagem que se encontra um tanto deslocado nno século XXI. Roman é um advogado que tem sua rotina alterada quando o sócio tem um infarto e uma série de acontecimentos o colocam na mira de um novo escritório de advocacia. Roman hesita, mas não vê muitos caminhos a seguir, especialmente por estar preso à defesa de um adolescente acusado de assalto seguido de morte - e o desenrolar deste crime o fará desrespeitar alguns dos princípios básicos de sua profissão (além de colocar sua vida em risco). Logo no início vemos que texto de Gilroy é um tanto disperso, já que parece estar faltando algumas cenas importantes para explicar os rumos que a vida de Roman segue, no entanto, o filme acerta quando o coloca interagindo com outros personagens que revelam o quanto ele está fora do lugar. O filme diz o tempo todo ao personagem que o mundo mudou, os discursos se tornaram mais complexos, as causas se subdividiram ao infinito e os discursos se tornaram enviesados ao limite do compreensível - e a performance de Denzel (em seu melhor trabalho há tempos) deixa claro o quanto é difícil para o personagem perceber estas mudanças, chegando a ser engraçado quando faz questão de se apresentar com a designação esquire após o nome (um título não oficial de respeito, sem definição precisa e que caiu em desuso através do tempo). Ao seu redor ninguém se importa os anos em que dedicou a vida ao trabalho de forma honesta. Não importa se ele tem um pôster de Angela Davis na parede de casa ou se apenas escuta a nata da música negra americana em seu iPod. Nada disso importa quando ele é ofendido por uma jovem durante uma palestra ou quando tenta ajudar um desconhecido caído em uma calçada e a polícia quase o prende por desacato. O mundo repete para tempo Roman que nada é realmente importante, sua história, sua causa, sua ideologia... até que ele cai em tentação e sua consciência se materializa diante de seus olhos. O texto de Gilroy pode parecer um tanto sem rumo e alguns personagens parecem não sair de um esboço (como o novo chefe vivido por Colin Farrell ou a militante vivida por Carmen Ejogo), mas o resultado consegue ser interessante, especialmente por retratar um tempo onde as convicções são bem mais complicadas de serem forjadas e vivenciadas. Pessimista (ou seria realista?), Roman J. Israel, esq. (e este nome não é por acaso) é um filme sobre declínio.
Roman J. Israel, esq (EUA/2017) de Dan Gilroy com Denzel Washington, Colin Farrell, Carmen Ejogo, Hugo Armstrong, Deron Horton e Amanda Warren. ☻☻☻
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