O pensamento nas trevas: uma triste história canadense.
Dez anos antes da tragédia naquela escola americana de Columbine, houve uma situação semelhante na cidade canadense de Montreal. Era dezembro de 1989 e um aluno armado chocou o mundo - com o acréscimo de uma carta em que ele tentava explicar suas motivações. A situação demonstrou como uma pessoa comum pode esconder uma mente perturbada - que se torna ainda mais perigosa com uma arma nas mãos. O então desconhecido Dennis Villeneuve sabia que enfrentaria polêmicas ao recontar esta história em seu terceiro longa. Em Politécnica as informações sobre as vítimas foram alteradas e filmado em preto e branco, Villeneuve apresenta uma precisão cirúrgica ao reconstituir o massacre, ousa ao tentar desvendar um pouco mais da psique do atirador (um rapaz que parece colecionar frustrações e que explode ao perder sua vaga de emprego para uma garota da escola). Não darei detalhes sobre a carta que o moço escreve, mas vale destacar como atribuir a causa de seus problemas a um grupo específico de pessoas é combustível para uma situação catastrófica. Villeneuve faz um belo trabalho com o elenco e provoca arrepios pelo tom realista que consegue imprimir, seja nas cenas mais triviais como nas mais agressivas. O cuidado com que ele acompanha os atores com a câmera é notável, assim como os enquadramentos que mostra um mundo que virou de cabeça para baixo (literalmente). O bom trabalho de edição sabe exatamente o momento em que deve mais sugerir do que mostrar (e assim ampliar o horror na plateia), sabe também como terminar de contar uma parte da história e retomá-la pela ótica de outro personagem. Estes cuidados tornam o filme menos hermético do que Elefante (2003) de Gus van Sant, que conta uma história parecida (e ganhou a Palma de Ouro em Cannes no ano de seu lançamento) e que sempre rendeu comparações. Ambos tem uma narrativa multifacetada, momentos de pura contemplação e aquela maneira peculiar de filmar os alunos caminhando por longos corredores. São filmes bastante incômodos, mas Politécnica ainda consegue ser mais claro em seus objetivos e fez Denis Villeneuve chamar atenção para além de sua terra canadense. Hoje consagrado (e com uma indicação ao Oscar por A Chegada/2016), fica evidente que aqui o diretor buscava construir seu estilo próprio. Insatisfeito com o resultado de seus dois filmes anteriores (32 de Agosto na Terra/1998 e Redemoinho/2000), Denis demonstra saber exatamente o que desejava fazer aqui. O filme é tenso, enxuto e preciso, um passo decisivo na carreira de um cineasta que lançou em seguida o ainda mais premiado Incêndios (2010) - filme que merecia ter ganho o Oscar de filme estrangeiro em 2011. Em comum com este, Politécnica já demonstrava a preocupação do diretor com um mundo repleto de personagens que não conseguem conversar sobre as suas angústias. O filme recebeu 11 indicações ao Genie Awards (O Oscar canadense) e foi premiado com nove estatuetas, incluindo filme, diretor e roteiro.
Politécnica (Polyrechnique / Canadá - 2009) de Denis Villeneuve com Maxim Gaudette, Sébastien Huberdeau, Karine Vanasse, Martin Watier, Evelyne Brochu e Pierre Yves-Cardinau. ☻☻☻☻
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