Dolan e Greenwood: jogos psicológicos.
Elephant Song teve uma das sessões mais disputadas no Festival Internacional de Cinema de São Paulo em 2014, mesmo assim, não obteve atenção dos distribuidores suficiente para chegar às telas de nosso país. Uma pena, já que se trata de um thriller psicológico interessante e que se tornou um dos filmes mais vistos no Canadá em seu ano de lançamento. O filme é ambientado em uma clínica psiquiátrica no ano de 1966, onde os funcionários estão inquietos com o desaparecimento de Dr. Lawrence (Colm Feore), que não aparece para trabalhar desde sua última conversa com o jovem paciente chamado Michael (Xavier Dolan). Diante da situação, a clínica considera que um dos seus administradores, Dr. Green (Bruce Greenwood) é a pessoa mais indicada a conversar com o rapaz e descobrir o paradeiro do tal médico. Sob várias advertências da enfermeira Peterson (Catherine Keener), Green se encontra com Michael e não parece intimidado com o jovem que está diante dele. Um tanto perdido por ter esquecido os óculos naquela manhã, Green aceita até um acordo com o paciente, que inclui não ler o relatório médico sobre seu quadro psiquiátrico. Bem articulado (e obcecado por elefantes) o rapaz argumenta que não seria justo conversar com alguém que já possui uma visão prévia sobre ele e, portanto, sua credibilidade já começaria abalada antes da conversa. A partir deste ponto, Michael conta tantas versões sobre seu relacionamento com Dr. Lawrence que Green acredita ter um verdadeiro escândalo iminente em mãos. No entanto, sempre existe a suspeita de que tudo pode ser uma fantasia e que as verdadeiras intenções do rapaz estão ocultas. O diretor Charles Binamé cria uma dinâmica bastante rica para sustenta o duelo entre médico e paciente. Enquanto Bruce Greenwood é pura introspecção (e Catherine Kenner segue o mesmo caminho), Xavier Dolan (que se tornou mais conhecido como diretor prodígio e que aqui aparece atuando pela última vez) opta por criar um personagem inquieto, de sorriso nervoso e de prosa pouco confiável. Dolan concebe um personagem que parece saído do Asilo Arkham de Gotham City, há tantos trejeitos, olhares e timbres de voz em Michael que tudo funciona como disfarce para sua alma torturada (que se revela naquela bela cena do quarto, onde ele está solitário, contemplando melancolicamente a luz que entra pela janela). Embora sua concepção teatral seja evidente (afinal, era uma peça que ganhou adaptação pelas mãos do mesmo autor, Nicolas Billon) e com alguns elementos que poderiam ser mais explorados (como a relação entre o médico e a enfermeira), Binamé cria cenas que fazem toda a diferença na construção do filme - e não estou falando da narrativa atravessada por depoimentos sobre o que aconteceu na clínica. Enquanto espectadores, embarcamos na proposta e nos surpreendemos com o final - onde o comportamento mais perigoso de Michael de revela de forma bastante coerente com o que vimos por todo o filme. A Canção do Elefante é uma grata surpresa.
A Canção do Elefante (Elephant Song / Canadá - 2014) de Charles Binamé com Bruce Greenwood, Xavier Dolan, Catherine Keener, Carrie-Anne Moss, Colm Feore e Larry Day. ☻☻☻☻
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