Izabél e Marjorie: como gerar um lobisomem.
O Ministério da Cultura divulgou recentemente quais são os vinte e dois filmes que estão na disputa para concorrer à vaga de representante brasileiro entre os cinco selecionados ao Oscar de filme estrangeiro no ano que vem. Entre os concorrentes chama a atenção este filme da dupla Juliana Rojas e Marco Dutra, uma mistura de drama, terror e fantasia na composição de um dos filmes brasileiros mais comentados do ano. Acho que não é um SPOILER dizer que este é um filme de lobisomem, só que com um tratamento diferente, bem fora da caixinha - o que já se tornou a marca registrada da dupla. Houve muitos debates acerca das duas partes que compõem o filme, partes que se complementam, mas que provoca um certo estranhamento pelo corte narrativo que provoca. A primeira parte conta a relação entre a grávida Ana (Marjorie Estiano) e a empregada Clara (Izabél Zuaa), as duas convivem boa parte do tempo sempre com reservas até que o relacionamento ganha novos contornos - e Clara conta um pouco mais sobre a história do pai do bebê que está esperando. Nesta parte o filme mescla alguns elementos realistas (as ambientações internas, as músicas e roupas) com outros de contos de fadas (as letras que aparecem em todas as cenas) e fantasias (as cores nas cenas externas e os fundos sempre remetendo a ilustrações), estes pontos ajudam a dar o tom do filme sem maiores problemas. As atuações são boas, especialmente da pouco conhecida Izabél Zuaa que segue contida num misto de curiosidade, horror e uma certa devoção às vontades de Ana (que como de toda grávida "devem ser satisfeitas") . Embora o envolvimento sexual entre as personagens soe um tanto forçado, a primeira parte da história é bastante instigante e deixa a expectativa bem alta quando chega a segunda parte. Por conta do novo ato, que se revela quase um novo filme, o filme precisa retroceder em sua tensão e começa a construir tudo de novo, mostra o filho de Ana, Joel (Miguel Lobo... !!!) e os cuidados de Clara para que ele se controle a cada dia - e algumas de suas medidas são realmente drásticas. O relacionamento entre os personagens é novamente bem conduzido, mas o tom demora a ganhar forma novamente (e em dois momentos cria até cenas de musical - a primeira funciona, já a segundo, cria um anticlímax bastante problemático). Sorte que o final consegue ser interessante com os dilemas de Clara e as escolhas que precisará fazer. O final é o horror mais clássico possível do gênero, mas até lá, o texto de Rojas e Dutra terão juntado elementos do folclore brasileiro e outros pontos relevantes. Embora ouse na quebra de sua narrativa, derrape aqui e ali (e os efeitos especiais nem sempre soem convincentes) o filme reforça mais uma vez o estilo dos cineastas. Nos últimos anos, os dois trabalharam sozinhos (ele fez o arrepiante Quando Eu Era Vivo/2014 e o suspense meio chileno O Silêncio do Céu/2016 e ela fez o musical divertidamente fúnebre Sinfonia da Necrópole/2014), mas demonstram que existe uma química ainda mais interessante quando estão juntos - assim como vimos na estreia Trabalhar Cansa (2011). Não por acaso, enquanto fã da dupla, percebo neste As Boas Maneiras uma prequel do maior mistério do primeiro longa-metragem da dupla. As Boas Maneiras não é perfeito e pode não ser o escolhido para a vaga do Oscar, mas ganha pontos por ser diferente da maioria dos filmes que passaram no cinema neste ano.
As Boas Maneiras (Brasil/2018) de Marco Dutra e Juliana Rojas com Marjorie Estiano, Izabel Zuáa, Miguel Lobo, Cia Moreira e Nina Medeiros. ☻☻☻☻
Nenhum comentário:
Postar um comentário