sábado, 1 de setembro de 2018

CICLO VERDE E AMARELO: Vazante

Luana e Adriano: lacunas demais. 

É curioso o caso de Vazante, filme solo da diretora Daniela Thomas que ficou bastante conhecida nos anos 1990 por conta de sua parceria com Walter Salles (falando nisso, quando ele lançará um filme novo?). Vazante recebeu elogios em suas exibições no exterior, mas quando foi exibido no Festival de Brasília recebeu duras críticas pela forma como a diretora conta sua história ambientada durante a escravidão no Brasil. Em Brasília, a diretora se viu no meio de uma sabatina que questionava a forma como ela retrata o negro em sua história, o que rendeu até comentários de que ela teria dito que se houvesse pensado em todas aquelas questões, não teria feito o longa. Tantas críticas acabaram rendendo um outro debate sobre o público de festivais e os filmes que são exibidos,  uma vez que muitas vezes os filmes são apreciados e questionados mais pelo tom político de suas narrativas do que pelos seus méritos cinematográficos. As duas discussões são interessantes, principalmente por conta do longa buscar o tempo inteiro este equilíbrio entre a estética e a história que tem para contar. Em termos artísticos o filme é um primor, Thomas tem cuidado na escolha dos ângulos, sabe exatamente o que mostrar para aumentar as sensações de melancolia e isolamento, além disso o uso de luzes e sombras é magnificamente trabalhado pela fotografia em preto e branco - o que torna visualmente atraente até as cenas mais escabrosas (o que para alguns será um defeito). Daniela Thomas também utiliza muitos silêncios e uma narrativa quase arrastada, com uma edição sugestiva e que deixa várias lacunas para o espectador preencher da maneira que considerar mais relevante. Considero que é justamente destas lacunas que surgiram as maiores críticas ao filme. Com poucos diálogos e personagens que quase sem identidade definida, o destaque fica por conta da jovem Beatriz (Luana Nastas), que é forçada a se casar com um jovem viúvo português no ano de 1821. Sem afeição e com a constante sensação de solidão, ela acaba se aproximando de alguns escravos da fazenda, o que causará consequências trágicas para a história. Em termos de roteiro, o arco de Beatriz e seu esposo, António (Adriano Carvalho) é o único que recebe um desenho mais definido, já que todos os outros não recebem igual tratamento, dando realmente uma coisificada sobre os escravos que aparecem no decorrer da história (que se revelam um amálgama de situações que já vimos várias outras vezes no cinema e na televisão brasileira). Eles trabalham, fogem, se rebelam, comem lama, mas não chegam a ter grande importância na história - e mesmo aqueles que tem algum destaque (caso da ótima Jai Baptista e o famoso Fabrício Boliveira) deixam a sensação de que não são aproveitados como deveriam (o mesmo acontece com as personagens das renomadas Sandra Corveloni e Juliana Carneiro da Cunha em personagens que são verdadeiros clichês ambulantes). A ideia de ter um roteiro mais aberto para gerar várias interpretações, acabou gerando um filme oco, sem novidades e até superficial ao abordar um período sempre em voga em nossa história. Vazante é um filme esteticamente irretocável, só faltou um roteiro consistente para explorar as possibilidades de seus personagens e aproveitar o bom elenco que tem em mãos.

Vazante (Brasil-Portugal/2017) de Daniela Thomas com Luana Nastas, Adriano Carvalho, Juliana Carneiro da Cunha, Sandra Corveloni, Jai Baptista e Fabrício Boliveira. 

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