Laura, David, Darren, Pope e Samara: um lugar ao sol de Hollywood.
Não tenho dúvidas de que Ryan Murphy é uma das cabeças mais criativas da televisão americana. Desde o seriado Glee, ele se tornou bastante cobiçado e a Netflix logo o convidou para seu acervo quando estava disponível. Se o produtor tem em seu currículo sucessos irretocáveis como American Crime Story (a primeira temporada é sublime, a segunda... nem tanto) e Feud, por outro lado ele tem irregularidades como American Horror Story e o próprio Glee que caiu de rendimento logo na segunda temporada - nem vou citar o fracassado Scream Queens (2015). Sua chegada na Netflix foi com The Politician (que não me empolgou ainda ao ponto de passar do primeiro episódio) e agora ele lançou Hollywood, que admito ter ficado com pé atrás para assistir. Fiquei com tanto receio que não procurei maiores informações sobre a produção e fiquei decepcionado quando descobri que era uma minissérie e não um seriado. Em suas obras, Ryan já demonstrou diversas vezes que é fascinado pelo cinema americano (ele mesmo já dirigiu dois filmes para a telona, o ótimo Correndo com Tesouras/2006 e o sucesso Comer, Rezar, Amar/2010 com quem trabalhou com Julia Roberts antes de a escalar para seu telefilme na HBO, The Normal Heart/2014) e aqui ele extrapola esta paixão. Só que não pelos caminhos tradicionais, mas através de uma fantasia sobre a época de ouro da capital do cinema. Misturando personagens reais e outros fictícios ele conta a história de como Hollywood poderia ter sido e deixa em nossas mentes qual efeito ela teria sobre o cinema que temos hoje. Seu texto injeta temas como representatividade e feminismo em choque com as posturas conservadoras da década de 1940. A ideia é interessante, mas na prática resulta ingênua em sua abordagem, especialmente pelo desfecho. O filme conta a história de um grupo de jovens que tenta o sucesso na capital do cinema, neste ponto trabalha com arquétipos bem conhecidos e que representam uma multidão de sonhadores que foram tentaram a mesma coisa. Um deles é Jack Costello (David Corenswet) que lutou na guerra e voltou com o sonho de se tornar astro, mas diante das dificuldades para sustentar a família acaba se prostituindo num posto de gasolina. Aos poucos somos apresentados a outros personagens como o jovem diretor Raymond Aisley (Darren Cris) que namora com a atriz Camille Washington (Laura Harrier), que está cansada da cor de pele lhe reservar somente papeis de empregada.
Os três logo irão se envolver num roteiro que está prestes a sair do papel, "Peg", filme escrito por um roteirista negro e homossexual chamado Archie Coleman (Jeremy Pope) - que por sua vez irá namorar com um jovem promissor que está prestes a mudar o nome para Rock Hudson (Jackie Picking). Hudson é um dos personagens reais que se misturam nesta Hollywood de fantasia imaginada por Ryan Murphy e Ian Brennan ... e talvez seja um dos pontos mais delicados da história. Já que sendo Hudson é o nome mais conhecido entre os personagens, todo mundo sabe como o astro sofreu por esconder sua sexualidade por décadas, já que sabia o impacto que revelar seu desejo por outros homens afundaria a sua carreira (por mais que muitos diretores e produtores compartilhassem o mesmo gosto era algo a ser sempre escondido). Na série parece que bastava assumir o desafio que tudo se resolveria como se vivessem no século XXI. Se nos dias atuais a pressão conservadora já é enorme, imagine naquele tempo? Talvez para desenvolver este aspecto de sua fantasia, o ideal seria Ryan criar uma série e não uma produção fechada, afinal, por mais que no decorrer das história os problemas apareçam, no desfecho (que bebe na fonte Tarantino de reinventar a história) tudo se resolve como num conto de fadas. Se levarmos em conta que Halle Berry foi a primeira atriz negra a ganhar um Oscar em 2002 (e até hoje escuta questionamentos e tem problemas para encontrar papéis relevantes) e o primeiro roteirista a ganhar o prêmio foi em 2010 (por Preciosa), vocês podem imaginar que somente boas intenções e talento não tornariam a jornada dos personagem mais fácil numa terra que historicamente não é para principiantes. Não há problemas em Ryan Murphy reimaginar a história, principalmente se sua intenção é pensar como seria o cinema americano hoje se realmente aqueles fatos ocorressem, mas é justamente neste ponto que a minissérie encontra seu maior dilema: ela funciona para o olhar que temos hoje, mas ao inseri-lo em outro tempo o resultado se torna um retrato infiel (e um tanto condescendente) do contexto histórico que retrata. É um risco que Ryan assume sem pestanejar e alcança um resultado comovente quando investe em sutilezas. Sei que parece uma grande rabugice de minha parte, já que o programa funciona muito bem até o penúltimo episódio, mas no final deixa claro que algumas situações mereciam ser melhor trabalhadas em novas temporadas e aqui aparecem apressadas (o novo filme do grupo merecia toda uma temporada para ser trabalhada e não poucos minutos). Com bons atores e a produção caprichada, Hollywood poderia render novas histórias sobre as fantasias de um apaixonado por cinema por vários anos... ou será que Hollywood pretende revisitar estes personagens na década seguinte em uma série de antologia de seu criador? Se for, acho uma ótima ideia.
Os veteranos: revolucionando Hollywoodland.
Os três logo irão se envolver num roteiro que está prestes a sair do papel, "Peg", filme escrito por um roteirista negro e homossexual chamado Archie Coleman (Jeremy Pope) - que por sua vez irá namorar com um jovem promissor que está prestes a mudar o nome para Rock Hudson (Jackie Picking). Hudson é um dos personagens reais que se misturam nesta Hollywood de fantasia imaginada por Ryan Murphy e Ian Brennan ... e talvez seja um dos pontos mais delicados da história. Já que sendo Hudson é o nome mais conhecido entre os personagens, todo mundo sabe como o astro sofreu por esconder sua sexualidade por décadas, já que sabia o impacto que revelar seu desejo por outros homens afundaria a sua carreira (por mais que muitos diretores e produtores compartilhassem o mesmo gosto era algo a ser sempre escondido). Na série parece que bastava assumir o desafio que tudo se resolveria como se vivessem no século XXI. Se nos dias atuais a pressão conservadora já é enorme, imagine naquele tempo? Talvez para desenvolver este aspecto de sua fantasia, o ideal seria Ryan criar uma série e não uma produção fechada, afinal, por mais que no decorrer das história os problemas apareçam, no desfecho (que bebe na fonte Tarantino de reinventar a história) tudo se resolve como num conto de fadas. Se levarmos em conta que Halle Berry foi a primeira atriz negra a ganhar um Oscar em 2002 (e até hoje escuta questionamentos e tem problemas para encontrar papéis relevantes) e o primeiro roteirista a ganhar o prêmio foi em 2010 (por Preciosa), vocês podem imaginar que somente boas intenções e talento não tornariam a jornada dos personagem mais fácil numa terra que historicamente não é para principiantes. Não há problemas em Ryan Murphy reimaginar a história, principalmente se sua intenção é pensar como seria o cinema americano hoje se realmente aqueles fatos ocorressem, mas é justamente neste ponto que a minissérie encontra seu maior dilema: ela funciona para o olhar que temos hoje, mas ao inseri-lo em outro tempo o resultado se torna um retrato infiel (e um tanto condescendente) do contexto histórico que retrata. É um risco que Ryan assume sem pestanejar e alcança um resultado comovente quando investe em sutilezas. Sei que parece uma grande rabugice de minha parte, já que o programa funciona muito bem até o penúltimo episódio, mas no final deixa claro que algumas situações mereciam ser melhor trabalhadas em novas temporadas e aqui aparecem apressadas (o novo filme do grupo merecia toda uma temporada para ser trabalhada e não poucos minutos). Com bons atores e a produção caprichada, Hollywood poderia render novas histórias sobre as fantasias de um apaixonado por cinema por vários anos... ou será que Hollywood pretende revisitar estes personagens na década seguinte em uma série de antologia de seu criador? Se for, acho uma ótima ideia.
Rock Hudson e seu agente: Sheldon do mal.
Hollywood (EUA-2020) de Ryan Murphy e Ian Brennan com David Corenswet, Darren Criss, Laura Harrier, Joe Mantello, Jake Picking, Jeremy Pope, Holland Taylor, Dylan McDermott, Samara Weaving, Patti LuPone, Jim Parsons e Mira Sorvino. ☻☻☻☻
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