Octavia, Kelvin e Naomi: um enigma chamado Luce.
Exibido no Festival de Sundance no ano passado, Luce se tornou um dos filmes mais comentados do Festival - e pela ambígua forma como trata um tema tão delicado como os estereótipos, foi bastante merecido. Baseado na peça de JC Lee (roteirista de séries famosas como Looking, How to Get Away with Murder e The Morning Show) a trama conta a história de Luce (Kelvin Harrison Jr.), adolescente que quando criança foi resgatado na zona de guerra de Eritreia e adotado por um casal americano. Devido a todas as situações que vivenciou, o menino cresceu sendo acompanhado por psicólogos e assistentes sociais, digerindo suas tragédias e se tornando um verdadeiro exemplo de superação - ou pelo menos é isso que se espera dele. Destaque na equipe de atletismo, no grupo de debates, ele se tornou uma espécie de parâmetro comparativo junto aos demais alunos. No entanto, a experiente professora Harriet Wilson (Octavia Spencer) percebe uma rachadura na imagem perfeita do rapaz e, preocupada por conta de uma redação feita por ele, conversa com a mãe (Naomi Watts) de Luce para que ela fique atenta ao comportamento do filho. Este é o ponto de partida para uma trama onde o estudante e a professora irão disputar quem é digno de maior credibilidade. Se por um lado a mãe evita pensar no pior sobre o rapaz, o pai (Tim Roth) desconfia que o menino possa não estar contando toda a verdade sobre os acontecimentos que começam a surgir. Não demora muito para que eles invertam os papéis e mais tarde não façam mais a mínima ideia do que pensar. O estreante Kelvin Harrison Jr. se sai muito bem como um garoto que pode ser tão inteligente quanto manipulador, que sabe exatamente o que fazer para desacreditar quem duvida de sua integridade e, neste caso, ele será capaz de fazer todos repensarem se no fundo o que acontece não é pura implicância da professora (some isso a um problema familiar de Harriet e a cosia só piora). A direção de Julius Onah (que antes dirigiu Uma Garota em Apuros/2015 e O Paradoxo Cloverfield/2018) faz um bom trabalho deixando seus personagens transitando no campo da sugestão, assim, deixa muitas das ações e intenções de Luce escondidas, deixando dúvidas sobre sua índole. Por conta disso, o elenco ao redor do protagonista também se destaca, Naomi Watts está excelente como a mãe que é incapaz de acreditar que seu filho possa ser diferente da imagem que sempre idealizou, assim como Tim Roth convence como o pai que está sempre em cima do muro e não sabe muito bem o que dizer. Também não podemos esquecer de Octavia Spencer, se afastando do tipo de papel que costumam oferecer para ela. Mais sisuda e um tanto amarga (e humanamente imperfeita), no final ela parece ser a voz da consciência de um rapaz que começa a não suportar as pressões que existem sobre ele. Luce (que nem é o nome de batismo do rapaz) consegue simular sorrisos, surpresa, ingenuidade e, por vezes, soa até afetado em seus trejeitos, por viver neste labirinto identitário, ele termina o filme sem que o espectador tenha certeza dos rumos que escolherá. Por se distanciar do óbvio em seu tema complicado, o filme é um grande acerto.
Luce (EUA/2019) de Julius Onah com Kelvin Harrison Jr., Octavia Spencer, Naomi Watts, Tim Roth e Andrea Bang ☻☻☻☻
Nenhum comentário:
Postar um comentário