Anne, Laurence e Judith: um incômodo fantasma por perto.
É mais do que curioso que com tantos filmes famosos e frequentemente lembrados, somente um longa de Alfred Hitchcock tenha recebido o Oscar de Melhor Filme, no caso Rebecca, um filme que fica até esquecido diante dos seus irmãos famosos como Um Corpo Que Cai (1958), Janela andiscreta (1954) e até Psicose (1960). Lançado em 1940 o filme foi indicado a onze prêmios da Academia, Hitch e todo o elenco foi lembrado, assim como várias categorias técnicas (o filme recebeu também o prêmio de Melhor Fotografia em Preto e Branco). O filme marcou a chegada do diretor em Hollywood pelas mãos do produtor David Selznick que estava ansioso para levar o nome mais badalado do cinema inglês para os Estados Unidos. Ele considerou que o texto baseado na obra de Daphne Du Maurier (que tem momentos que lembram muito o clássico Jane Eyre de Charlotte Brontë) seria um sucesso nas mãos de Hitch. No entanto, o diretor foi perdendo cada vez mais o interesse pelo projeto, especialmente quando teve problemas para escalar a protagonista. O filme conta a história de uma mulher modesta e insegura (Joan Fontaine, irmã da já famosa Olivia de Havilland) que trabalha como dama de companhia para uma senhora rica e um tanto grosseira. Quando o filme começa as duas estão em uma viagem pela Europa e encontram o charmoso viúvo, Sr. De Winter (Laurence Olivier). Ele se tornou viúvo a pouco tempo e demonstra cada vez mais interesse pela jovem que cruza o seu caminho. Os dois acabam se casando e o que poderia ser um conto de fadas se torna um verdadeiro tormento. Na mansão onde a nova Senhora De Winter irá viver, tudo transpira a presença da falecida Rebecca, assim como todos idolatram a mulher que não mora mais ali. Rebecca foi convertida em uma espécie de entidade acima do bem e do mal - e paira sobre aquela casa feito um fantasma (para desespero da nova senhora que torna-se cada vez mais insegura e deslocada). Esta tensão prejudica o relacionamento com o esposo, que se torna mais arredio e parece estar escondendo algo. O roteiro tem o grande atrativo de subverter o que a plateia espera, existem guinadas que sempre caminham para o lado oposto do que se imagina, ao ponto da protagonista perder o destaque na parte final, deixando o esposo no centro da narrativa. Fontaine e Olivier estão muito bem em cena, mas reza a lenda que Fontaine era insegura de verdade, fazendo com que Hitchcock construísse um ambiente bastante hostil para ela nos bastidores para que sua atuação ficasse ainda mais autêntica. Apesar dela não ser a escolha do diretor para o papel (foi Selznick que decidiu por ela) não houve ressentimentos entre a estrela e o diretor, especialmente depois que Anne foi indicada ao Oscar por seu trabalho e repetiu a parceria com o cineasta em seu filme seguinte (Suspeita/1941 que lhe rendeu o Oscar de melhor atriz). Outra interpretação feminina que merece atenção em Rebecca é da australiana Judith Anderson que encarna a estranha governanta Srª Danvers que tem uma das cenas mais arrepiantes no desfecho. Com cenários imponentes e a elegância de sempre, Hitchcock faz um trabalho que impressiona pela fluidez, embora seja diferente do que está acostumado a fazer. A montagem é precisa, a fotografia impressiona e a trama que mistura romance, suspense, tribunal e um senso de humor maldoso não soa datada e pode até conquistar um lugar entre seus filmes favoritos do cineasta.
Rebecca - A Mulher Inesquecível (Rebecca / EUA - 1940) de Alfred Hitchcock com Anne Fontaine, Laurence Olivier, George Sanders, Judith Anderson, Nigel Bruce e Florence Bates. ☻☻☻☻
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