O britânico Sacha Baron Cohen já provou que não é ator de um personagem só, no entanto, por mais que tenha buscado papéis diferentes nos últimos anos (como em Os Sete de Chicago/2020), existe um consenso de que um personagem sintetiza melhor tudo o que ele é capaz de expressar através de seu senso de humor, digamos, peculiar. Trata-se de Borat Sagdiyev. Criado pelo comediante para o programa Da Ali G Show(2003-2004). Mas seu humor ácido sobre preconceitos diferenças culturais ganhou o mundo com sua versão para o cinema de nome quilométrico Borat: O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (2007) em que o ator vestido do personagem passava grande parte do tempo interagindo com pessoas que acreditavam na apresentação esdrúxula que o título prometia. Que o humor de Borat é repleto de besteirol, absurdos, grosseiras, bizarrices e um bocado de preconceitos sintetizados (num amálgama inconcebível até então) todo mundo já sabia, mas ver pessoas comuns embarcando naquelas sandices achando que era algo aceitável deu um tempero considerável (e assustador) ao documentário farsesco. Obviamente que havia todo aquele exagero sobre a realidade do Cazaquistão, as piadas com judeus apresentados como monstros e aquela luta inesquecível que levou o filme muito além do que a maioria das comédias ousaram chegar. Pelo trabalho Cohen se tornou conhecido mundialmente, levou para casa o Globo de Ouro de ator de comédia e ainda foi indicado ao Oscar de roteiro adaptado, mas para além disso, mostrou o quanto uma sátira corrosiva pode ser importante para refinar nosso olhar sobre um mundo em que tudo parece banalizado. Se treze anos atrás o filme conseguia alcançar este mérito, imagina atualmente onde se questiona se a Terra é redonda ou se o holocausto realmente aconteceu, ao mesmo tempo em que a patrulha do politicamente correto trabalha a todo vapor? São extremos de um mundo polarizado que O Filme Subsequente de Borat: Entregando um Suborno Prodigioso ao Regime Americano para Beneficiar a Nação que já foi Gloriosa do Cazaquistão procura conciliar em sua hora e meia de atrocidades que divertem e assustamao apresentar um mundo que parece pura ficção. A veia do mockumentary continua ali, afinal, Borat sofreu as consequências pela imagem que apresentou do seu país. Foi castigado e preso, até que para se redimir foi encaminhado para uma missão: aproximar o presidente de seu país do presidente dos Estados Unidos. Nesta tarefa ele tem dois obstáculos: sua filha adolescente que o persegue até a Terra do Tio Sam e a fama conquistada pelo seu filme anterior. Logo a filha adolescente se torna alvo daquelas piadas de puro escracho, como o "manual para proprietário de filhas" que prega sobre cria-la numa jaula e outras delicadezas (e revela a desconhecida Maria Bakalova como ótima parceira de escracho). Já a fama rende uma série de disfarces que revela que se a Terra não é plana, pelo menos ela deve girar para trás ao repetir o procedimento de câmera (de celular muitas vezes) escondida. Se ele constrói uma caricatura do Cazaquistão, por outro lado, sua jornada pelos EUA revela um país real bastante complicado. Neste ponto, existe o aspecto que mais me surpreendeu no filme: trata-se da primeira produção cinematográfica a retratar a pandemia de Covid-19, praticamente em tempo real (e este ponto que deixa o arremate do filme com um sabor ainda mais especial). Borat 2 atira para todos os lados com a mesma bala: feministas, democratas, republicanos, judeus, Facebook, baby sugars, teorias revisionistas, leste europeu, movimento anti-vacina, conspiração chinesa e apresenta uma teoria para a proliferação do vírus que ninguém imaginaria. Ainda que o filme não tenha o gosto da novidade do primeiro, a distância de treze anos entre os dois serviu para mostrar que a piada que era local no primeiro filme agora se universalizou e, o mundo se parece cada vez mais com uma grande piada - que seria cômica... se não fosse trágica.
Borat: O filme Subsequente (Borat Subsequent Moviefilm: Delivery of Prodigious Bribe to American Regime for Make Benefit Once Glorious Nation of Kazakhstan) de Jason Woliner com Sacha Baron Coen, Maria Bakalova, Tom Hanks, Dani Popescu e Miroslav Tolj. ☻☻☻☻
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