Jean e Marie: o mundo é um redemoinho.
Pode se dizer que Denis Villeneuve ganhou o mundo em seu terceiro filme, Incêndios (2010) que foi indicado ao Oscar de filme estrangeiro, se tornou um dos filmes mais contundentes deste século e nga carimbou a passagem do cineasta canadense para Hollywood. Antes, Villeneuve havia realizado três obras que chamaram atenção em seu país. Redemoinho foi um delas. Esta sua segunda obra foi premiada no Genie (o equivalente ao Oscar) nas categorias de melhor filme, direção, atriz, roteiro e fotografia, tendo outras cinco indicações. O filme chegou a ser lançado no Brasil e lembro que causou grande estranhamento quando a plateia se deparou com um filme cujo o narrador é um peixe prestes a morrer. Este é o aspecto mais estranho de um filme que gira em temas como culpa, morte, coincidências e filiação tendo a água como uma espécie de cola para a trama. Apesar do peixe moribundo, a protagonista é Bibi Champagne (Marie-Jozée Croze), modelo que vive à sombra da beleza da mãe e que está tendo problemas profissionais e pessoais. Apesar do glamour diante das câmeras, Bibi não leva uma vida regrada e a realização de um aborto a afeta de uma forma que ela não imaginava. Diante dos problemas pessoais que enfrenta, os enjoos permanecem e uma dose de culpa também perpassa sua mente e se intensifica ainda mais quando ela atropela um pescador à caminho de casa. A ideia de morte é bastante forte em Redemoinho e a edição quebrada causa estranheza neste percurso, mas funciona quando insere o mergulhador Evian (Jean-Nicolas Varreault) na história e coloca a protagonista diante de um verdadeiro impasse. A trama poderia ser apenas uma história de amor comum, se Villeneuve não o decorasse com cenas que vão e voltam sobre outra perspectiva mostrando como a culpa pode dar lugar à redenção ao sinal de perdão se os personagens permitirem. O título se refere à sucessão de acontecimentos que podem tragar a protagonista para o bem ou para o mal, assim como estabelece a forte referência aquática da história (que ainda conta com as música The Ocean Doesn't Want Me Today de Tom Waits). Vale destacar o trabalho de Marie-Jozée Croze que tem momentos bastante intimistas de desamparo na pele de Bibi e nos motiva a acompanhar os caminhos estranhos que o diretor escolhe para contar sua história cheia de coincidências. Sobre o filme, o cineasta declarou: “Do meu humilde ponto de vista, foi inspirado da seguinte maneira: todos nós temos um incrível sistema embutido de defesa pessoal e social: interpretamos o mundo e construímos para nós uma imagem dele, que nos conforta e acalma nossa consciência e fazemos isso instintivamente. Para mim, Maelstrom é uma chamada lúdica para ser responsável e ser cuidadoso. Alguns de meus amigos acharam essa definição infantil e tentaram me convencer de que Maelstrom era, em vez disso, um drama sombrio e sério sobre uma mulher emergindo do caos e da mitomania. Outros consideram-no uma fábula noir luminosa de uma viagem aos limites da realidade e do mito. Isso é ridículo. Não acredite em uma palavra do que eles dizem”. Por tudo isso é curioso rever o filme depois que Villeneuve se tornou o favorito para filmar tramas ambiciosas de ficção científica depois que o elogiado A Chegada (2016) foi lançado, rendendo convites para filmar Blade Ranner 2049 (2017) e a aguardada nova versão de Duna. Villeneuve já demonstrava aqui sua inquietação para contar histórias (e se vissem este filme, provavelmente estranhariam menos o final de O Homem Duplicado/2013), o gosto por protagonistas femininas e o cuidado com a estética, que aqui se faz presente em um trabalho de fotografia deslumbrante em tons de azul na narrativa de um peixe com pendores filosóficos em seu leito de morte.
Redemoinho (Maelström / Canadá - 2000) de Denis Villeneuve com Marie-Jozée Croze, Jean-Nicolas Varreault, Stephanie Morgenstern, Pierre Lebeau e Virginie Dubois. ☻☻☻
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