Um homem está interessado em comprar um apartamento, em uma de suas visitas conhece uma pessoa por lá e aquele lugar se torna o cenário de um tórrido relacionamento. Lido assim, pode até parecer que vou comentar sobre O Último Tango em Paris/1972 (outro filme que estou devendo uma resenha faz tempo), mas na verdade estou falando de um filme diferente: O Acrobata, longa canadense escrito e dirigido por Rodrigue Jean que gerou polêmica ao ser exibido em festivais por suas cenas bastante explícitas. Foi esta semelhança que me deixou bastante curioso com esta produção. Sim, o filme de Bertolucci também gerou gera frisson por suas cenas de sexo (e inúmeras especulações sobre a sexualidade dos personagens), mas por aqui as cenas são bem mais desinibidas... e no lugar de Marlon Brando e Maria Schneider estão dois homens, o canadense Sébastien Ricard e o estreante bielorusso Yuri Paulau. Ricard tem vários filmes no currículo (incluindo o excelente ganhador do Oscar "As Invasões Bárbaras"/2003 de Denis Arcand) e surpreendeu muita gente pela desenvoltura como encarna Christophe, um homem maduro, solitário e que de vez em quando visita a mãe doente (a veterana Lise Roy) no hospital. O filme não gasta muito tempo apresentando os detalhes da vida do personagem, concentra-se mais nos efeitos que o encontro com Micha (Yuri) despertará em sua vida. O diretor opta por criar uma narrativa cheia de sobreposições e contrastes, seja da construção interminável que abre o filme e serve de paisagem para o apartamento habitado pelos amantes, até a relação dos guindastes com as cordas que suspendem os corpos dos acrobatas - e ao que tudo indica, uma desta cordas traiu Micha que se acidentou e está impossibilitado de continuar em seu ofício. De uma terra distante, sem trabalho e sem um lugar para ficar diante do rigoroso inverno canadense, Micha acaba retornando ao tal apartamento em que conheceu Christophe e os dois estabelecem um relacionamento tórrido que se intensifica em meio aos jogos de poder de um sobre o outro, com direito a traços sadomasoquistas. Neste ponto a própria forma como os dois personagens encaram as emoções torna o filme ainda mais interessante, a forma como Micha aprendeu a suportar a dor e o desprezo que sente pela vida regrada de Christophe dá o tom de várias cenas, assim como o fato de Christophe sentir-se instigado por aquele rapaz desconhecido e do qual sabe quase nada. O maior contraste do filme é a frieza da narrativa e das ambientações com as cenas de sexo protagonizadas pelos dois atores (que definitivamente deve fazer do filme uma obra da qual os conservadores devem manter distância). Quem se aventurar, irá conhecer a história de dois homens em um mundo secreto no qual podem perder as rédeas e fugir do que existe da porta para fora. Vendo o filme ainda percebi outras semelhanças com o filme do Bertollucci: a mulher no leito de morte, a cena da dança no final com sentido completamente diferente e, ao longo de todo filme, a dinâmica dos papéis sexuais instaurada entre os dois personagens. O desejo pode ser mesmo bastante revelador.
O Acrobata (L'Acrobate / Canadá - 2019) de Rodrigue Jean com Sébastien Ricard, Yuri Paulau, Lise Roy, Victor Fomine, Chloé Germentier, Françoise Mercure e Amine Farhat. ☻☻☻☻
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