Emma Cruella: releitura esperta de clássica vilã da Disney. |
Sou daqueles que sempre olha com desconfiança quando a Disney anuncia uma nova versão dos seus clássicos. Se levar em conta os últimos lançamentos do gênero feitos pelo estúdio, a desconfiança cresce ainda mais. Eis que quando anunciaram uma versão jovial sobre a origem de Cruella DeVil, a vilã que queria transformar filhotes de cachorro em um casaco de pele no clássico 101 Dálmatas (1961) e já fora encarnada com desenvoltura plena por Glenn Close em sua versão live action de 1996... então a coisa piorou ainda mais. No entanto, conforme eram revelados os nomes envolvidos no projeto a desconfiança começava a diminuir e se transformar em expectativa. A começar pelo roteirista Tony McNamara que aqui trabalha ao lado de Dana Fox (que pelo currículo deve ter ajudado a amenizar as maiores sandices da mente do parceiro). Depois veio Emma Stone, que já tem um Oscar na estante por La La Land (2016) e esteve memorável em sua parceria com McNamara na indicação de ambos ao Oscar por A Favorita (2018). Na direção está um moço que eu curto bastante, mas que ainda não ganhou o devido reconhecimento, o australiano Craig Gillespie, responsável pelos ótimos A Garota Ideal (2007) e Eu, Tonya (2017). Gillespie não tem medo de assumir riscos em sua narrativa, alcança ótimos resultados quando o personagem principal testa a compreensão da plateia, filma bem e tem uma energia que falta em muitos diretores de Hollywood. Aqui sua energia beira a elétrica ao contar a história de Stella, a menina que nasce com a anomalia de ter metade do cabelo preto e outra metade branca. Diante da perseguição dos colegas a vida na escola nunca foi fácil (e a pequena Tipper Seifert-Cleveland a interpreta deliciosamente). Coube à mãe segurar às rédeas de uma menina destinada à rebeldia. Eis que um dia uma tragédia separa mãe e filha e a menina precisa se virar. Se juntando a dois jovens delinquentes, o trio passa a realizar assaltos e golpes variados enquanto o sonho de Estela (agora vivida por Stone) de enveredar pelo mundo da moda só cresce. Eis que o caminho para tornar seu sonho realidade é trabalhar com a famosa Baronesa (Emma Thompson), dona de uma grife cultuada e que em já cruzou o caminho da menina em outros tempos. Se por um lado faz um tempo que Estela quer ser a menina que sua mãe sempre quis, por outro, seu relacionamento tempestuoso com a intragável Baronesa liberta seu lado mais sombrio e a faz enveredar por uma verdadeira guerra no mundo fashion. Nada melhor para isso do que inserir a personagem na rebeldia dos anos 1960 e no estilo punk dos anos 1970. O resultado é um filme que foge do formato quadradinho das recentes live actions da Disney ao som de música boa e figurinos impressionantes. É verdade que os dálmatas estão por lá (na verdade são três) e podem até fazer a plateia imaginar sua relação com a ideia que a estilista terá no futuro, no entanto, a Cruella aqui está em início de carreira e antes de ser vista como uma vilã desalmada, ela nos é apresentada como uma anti-heroína que tem lá suas razões de se rebelar. Emma Stone está ótima em cena e torna até compreensível a postura de nada ser sagrado para sua personagem (e atriz visivelmente diverte-se muito com esta releitura da personagem), ela é seguida de perto por Emma Thompson, que assim como sua parceira distancia-se ao máximo do tipo bonzinho que vimos em tantas outras produções estreladas por elas. O elenco de apoio também merece destaque, seja pela dupla já conhecida de comparsas Jasper (Joel Fry) e Horace (Paul Walter Hauser), ou o fashionista calcado em David Bowie chamado Artie (John McCrea). Divertido, esperto e com atuações inspiradas, Cruella tem tudo para se tornar um hit e, se os Deuses do Cinema permitirem, também pode mudar a fórmula insossa que a Disney utilizava em suas releituras até então.
Cruella (EUA - Reino Unido / 2021) de Craig Gillespie com Emma Stone, Emma Thompson, Mark Strong, Joel Fry, Paul Walter Hauser, John McCrea e Tipper Seifert-Cleveland. ☻☻☻☻
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