Anatoliy: personagem real em clássico de Tarkovsky.
Depois dos prêmios de A Infância de Ivan (1962), o cineasta Andrei Tarkovsky investiu em um épico de quase três horas a ser lançado em seguida. Se o filme anterior criou alguns impasses perante os censores da União Soviética pela forma incomum com que retratou a obra de Vladimir Bogomolov, aqui a situação não foi diferente. Ao escolher como protagonista o famoso monge pintor Andrei Rublev, o diretor estava mais interessado em construir um retrato do período em que o artista viveu, a sanguinolenta Rússia Medieval assolada pela barbárie enquanto seus personagens discutem entre o paraíso e a danação. Visto hoje, o filme também demonstra muita relação com os dilemas do próprio cineasta ao ter que trabalhar com arte num país em que suas obras eram constantemente interrogadas por seus significados alegóricos. O diretor fixa aqui sua opção pela não obviedade ao contar histórias, mesmo quando se trata de uma biografia. Aqui Rublev (Anatoliy Solonitsyn) é apresentado como um homem bom, forte e temente a Deus, mas encontra tantas atrocidades pelo caminho ao se tornar responsável pela criação dos afrescos de uma catedral que começa até a questionar sua própria fé. Enquanto o protagonista sofre seus próprios dilemas, o diretor apresenta todo aquele universo ao seu redor, entre loucos, pessoas cegas pela fé, pagãos, soldados, pessoas comuns, além de combates, e massacres provocados pelas invasões de tártaros e mongóis. Este peso da parte histórica do filme acontece também por haver poucos registros sobre a vida de Rublev, que viveu entre os séculos XIV e XV e o texto busca perceber como seria sua presença durante aquele período conturbado. A saída foi criar uma narrativa dividida em sete episódios, sem maiores relações entre eles, calcados em acontecimentos importantes que precederam o período dos czares. O resultado é um filme com quase três horas de duração que foi finalizado em 1966, mas que foi exibido oficialmente somente em 1969, -ano em que também foi exibido no Festival de Cannes - mas conseguiu ser distribuído mundialmente somente em 1973. Existe toda uma polêmica em torno com sua do longa em sua mistura de religiosidade e violência, mas muitos os consideram um dos filmes mais otimistas da cinematografia do diretor, principalmente pela postura de seu personagem principal que é tratado de forma bastante respeitosa (lembrando que se tratava de um filme financiado por verba de um governo comunista). A produção constrói uma verdadeira odisseia religiosa nas entranhas da história russa, o que o torna bastante querido pelos historiadores. Para a maior parte do público o resultado pode ser cansativo, afinal, somos convidados a acompanhar uma verdadeira colagem de acontecimentos sangrentos de um período bastante cruel da história. Filmado em preto e branco, o filme começa com impressionantes tomadas aéreas e demonstra mais uma vez o gosto do cineasta em deixar os cenários contarem suas histórias por si só. Ao final, ele revela as cores das obras de Rublev na famosa catedral que é construída ao longo da trama. Apesar do seu formato diferente para o gênero, este é o filme mais tradicional (ou explícito) do diretor que ficou famoso por suas poesias visuais e trabalhos repletos de simbologias.
Andrei Rublev (União Soviética /1966) de Andrei Tarkovsky com Anatoliy Solonitsyn, Ivan Lapikov, Nikolay Grinko e Irina Tarkovskaya. ☻☻☻
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