Se Lars von Trier é hoje um dos diretores mais controversos do cinema, em sua época de estudante na Escola Dinamarquesa de Cinema a situação não era muito diferente. Ele se tornou reconhecido por seu jeito questionador que incomodava muitos dos seus professores. Avesso a seguir às regras, Trier desafiava a estética imposta em seus curta-metragens e começou a ser considerado um artista pretensioso e arrogante desde então. Reza a lenda que foi por conta dessa percepção sobre o seu trabalho que adotou "von" em seu nome. O cineasta já demonstrava que estava em busca de uma linguagem única em seu primeiro longa-metragem, Elemento de Um Crime que completará quarenta anos em 2024 e que pode ser assistido na MUBI. Se o cineasta bebe na fonte dos filmes noir na construção de sua história, em sua estética ele apresenta um estilo próprio com a fotografia em tons gastos de amarelo e vermelho, uma luz que ressalta os vidros embaçados, as paredes úmidas e a sujeira local. As ambientações sempre soam decadentes, sórdidas e abandonadas. Não existe o glamour visto em filmes clássicos do gênero, pelo contrário, tudo soa infernal. Este neonoir conta a história do policial Fisher (Michael Elphik) que chega ao Cairo após conduzir uma investigação sobre um serial killer na Europa. Ele não lembra muito bem sobre o que houve e procura ajuda de um terapeuta para que através da hipnose possa recuperar suas memórias. Suas lembranças se mostram um verdadeiro quebra-cabeças envolvendo outros policiais, vítimas, suspeitos e aquela que acredita ser amante do assassino, uma prostituta chamada Kim (Me Me Lai), com quem acaba se envolvendo. Se o roteiro é um tanto truncado ao desenvolver a história com base na percepção do personagem, por outro lado, Trier estava disposto a demonstrar tudo o que sabia fazer com uma câmera na mão. De cenas em slow motion, ao uso de ângulos inventivos, o diretor parece estar mais preocupado com a forma do que com o conteúdo de sua trama. Por conta disso o filme chamou pouca atenção no Festival de Cannes e foi praticamente ignorado pelo público. Hoje o filme é visto como a primeira obra de sua primeira trilogia, a Velho Continente (composta ainda pelos seguintes Epidemic/1987 e Europa/1991) em que o diretor experimenta recursos tecnicamente elaborados para retratar a decadência da Europa. O mais interessante de Elemento do Crime é perceber aspectos que mais tarde retornariam às obras do provocador cineasta.
Elemento de Um Crime (Forbrydelsens Element / Dinamarca - 1984) de Lars von Trier com Michael Elphick, Esmond Knight, Me Me Lai, Jerold Wells, János Herskó e Stig Larsson. ☻☻
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