James e Hugh: amor às escondidas.
Nos anos 1910, o jovem Maurice Hall (James Wilby) vai estudar na renomada Universidade de Cambridge. Sua família enxerga nisso a chance do rapaz finalmente colocar a vida nos eixos, encontrar um bom emprego e constituir uma família. Maurice realmente parece almejar todas essas coisas e seguir os rumos de uma vida convencional, pelo menos até se tornar amigo de Clive Durham (Hugh Grant), um rapaz que parece conhecer melhor suas vontades. Quando Clive declara seu amor por Maurice, o rapaz não sabe como reagir. O rejeita por algum tempo, mas depois, os dois viverão um romance que atravessará vários anos em segredo, já que na Inglaterra, era crime fazer sexo com uma pessoa do mesmo gênero na Inglaterra, ainda que fosse consensual, até o final dos anos 1960. Serem descobertos seria não apenas um escândalo, mas também algo que comprometeria para sempre a vida social de ambos. Se Maurice começa a aceitar cada vez mais os sentimentos que nutre pelo parceiro, Clive começa a reavaliar cada vez mais os riscos que corre, sendo capaz de tomar decisões que afetarão para sempre a vida de ambos. Maurice é a adaptação de James Ivory (diretor do ótimo Vestígios do Dia/1993 e roteirista oscarizado por Me Chame Pelo seu Nome/2017) para o clássico de E.M. Foster, o filme torna-se ainda mais interessante se você conhece o estilo "quadradinho" do cinema de Ivory. Adepto de uma linguagem convencional, com reconstituição de época feita no capricho e fotografia exuberantes, acho que o cineasta nunca mais conseguiu disfarçar sob esta estética um conteúdo tão subversivo. Devemos lembrar que o filme foi lançado em 1987 e filmes mainstream sobre personagens gays ainda eram vistos com desconfiança (ou seria rejeição?) do grande público, Ivory acrescenta aqui não apenas alguns beijos como também cenas de nudez frontal masculina. O filme lhe valeu o Leão de Ouro no Festival de Veneza, além dos prêmios de melhor trilha sonora (que é por vezes fantasmagórica) e melhor ator para a dupla Grant e Wilby. De fato os atores são um destaque a parte pela naturalidade com que retratam a atração entre os dois personagens, especialmente nas partes mais sutis dos conflitos entre o desejo e a repressão vivida por ambos. Ivory capricha nos detalhes, sejam toques ou olhares, deixando nas entrelinhas sensações que vão da insegurança, passando pela culpa, ciúme e a frustração. Talvez a tarefa mais difícil tenha ficado para Wilby que tem o sofrimento provocado pela inadequação de Maurice mais evidente diante da câmera. No entanto, seria crueldade não ressaltar o trabalho de Rupert Graves como o empregado Alec Sccuder que acena para Maurice como a oportunidade de um final feliz ao mesmo tempo que pode ser sua perdição completa. Com duas horas e vinte minutos de duração, Maurice se tornou um clássico do cinema LGBTQIA+ e, não por acaso, apareceu no Oscar somente na categoria de melhor figurino. James Ivory deve ter ficado surpreso, já que seu filme anterior, Uma Janela Para o Amor/1985 (já em parceria com o produtor Ismail Merchant e a roteirista Ruth Prawer Jhabvala) havia sido lembrado em cinco categorias, incluindo filme e direção. Acho que a Academia não estava preparada para uma produção desse quilate. Maurice era realmente um filme à frente do seu tempo.
Maurice (Reino Unido/1987) de James Ivory com James Wilby, Hugh Grant, Rupert Graves, Simon Callow, Denholm Elliott, Barry Foster, Phoebe Nicholls, Mark Tandy e Ben Kingsley. ☻☻☻☻
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