Ganz e Berger: últimos momentos de um casal com 50 anos de convivência.
Anita (Senta Berger) e Fred (Bruno Ganz) são casados há cinquenta anos, os filhos já estão crescidos e a rotina já estabeleceu um nível de intimidade e comunicação que um gesto ou olhar é capaz de transmitir inúmeros significados. Mas somente um dos seres mais ingênuos do mundo não imaginaria que debaixo de cinco décadas de convivência não haveria segredos que o casal prefere evitar. O roteiro poderia apenas acompanhar a vida desse casal maduro sem grandes arroubos narrativos se um dia Anita não encontrasse Fred na rua e ele não a ouvisse. Ela acaba seguindo-o e descobrindo que ele está mobiliando um apartamento somente para ele numa localidade próxima ao trabalho. Esse é o elemento que fará que a rotina equilibrada do casal seja abalada e os filhos descubram que o pai está com câncer e que houve infidelidades de ambas as partes nos anos em que dividiram a mesma cama. Ainda bem que a cineasta alemã Sophie Heldman deixa o escândalo de lado e opta por uma abordagem sutil sobre os sentimentos de seus personagens com a proximidade da morte. Não é o tipo de filme que agrada muita gente, há muitos silêncios e cenas quase arrastadas que procuram nos situar no cotidiano de um casal com o ritmo de vida confortável, mas desacelerado. No entanto, as atuações de Senta Berger e Bruno Ganz valem cada cena. Enquanto ele dá conta de um senhor que insiste em não se tratar, ela enfrenta uma espécie de ensaio para a solidão que viverá na ausência do marido. Se ele prepara um apartamento para ter momentos de privacidade, ela acaba se hospedando numa casa de repouso para testar a solidão futura. Os desdobramentos do roteiro escrito pela própria diretora e seu colega Felix Zu Knypahusen sempre caminham para os caminhos mais inusitados, isso confere cenas áridas como a de Anita vendo a devastação de seu quintal após uma tempestade mas também cenas saborosas como do casal dançando com a neta na festa de formatura - um prenúncio para a última noite de amor que terão. Muita gente deve estranhar que o roteiro não gasta tempo desenvolvendo os coadjuvantes, mas é um trabalho tão focado na atuação de seus protagonistas que nem nos importamos, afinal são eles que nos envolvem na satisfação de ver o filme. Ganz está numa atuação fenomenal e mais simpática do que costuma aparecer e Berger consegue esconder o desespero de sua personagem com muita elegância. Até a melancólica cena final é como se observássemos as engrenagens de um relacionamento onde ambos param de resistir ao perceber que a vida de um passa a ser essencial para o outro. Heldman merece crédito por criar um dos filmes mais intimistas do cinema alemão, um trabalho difícil mas delicadamente executado.
Cores no Escuro (Satte Farber vor Schwarz/Alemanha-2010) Sophie Heldman com Bruno Ganz, Senta Berger, Barnaby Metschurat e Traute Hoess. ☻☻☻☻
Cores no Escuro (Satte Farber vor Schwarz/Alemanha-2010) Sophie Heldman com Bruno Ganz, Senta Berger, Barnaby Metschurat e Traute Hoess. ☻☻☻☻
Assisti ontem, e gostei muito de sua resenha, Wellington. Parabéns pelo trabalho.
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