O clã Vogue: a arte de recriar/provocar o mundo fashion.
Faz tempo que parei de pensar sobre o mundo da moda com aquele olhar de desdém. Acho que desde pequeno, minha mãe procurou educar nosso olhar para saber como é se vestir bem. Tendo cursos de corte e costura, além de estar sempre atenta ao caimento e combinações das roupas de nossa família, minha mãe sempre deixou claro que vestir-se bem é mais do que usar roupas caras. Se trata de construir uma personalidade a partir do que se usa, afinal, a primeira impressão é a que fica - e para desconstruí-la da mais trabalho do que escolher a camisa e o sapato certo em cada ocasião. Portanto, é inevitável que um documentário HBO desperte o meu interesse quando coloca diante das câmeras as editoras de moda da revista Vogue. Mais do que falar sobre quem ditou a moda durante boa parte do século XX, o filme se preocupa em explorar um pouco da personalidade de um grupo de mulheres, cada uma com seu estilo particular e criatividades distintas, que conseguiu construir a fama da revista de moda mais conceituada de todos os tempos. In Vogue conta a partir de uma linha do tempo, ensaios fotográficos que construíram na história da publicação, muitas delas com fotografias polêmicas - seja de mulheres (muito bem vestidas) com trajes de banho numa sauna na década de 1970, ou beldades posando com muletas numa alusão aos saltos cada vez mais altos, o filme consegue demonstrar como a revista construiu seu legado com imagens muito mais provocativas do que a frivolidade atribuída ao mundinho fashion. Além dos ensaios elaborados (destaque para a concepção de Alice no País da Maravilhas com os personagens sendo interpretados por estilistas como Jean Paul Gaultier, Marc Jacobs e Karl Lagerfeld), surreais (uma modelo com o rosto coberto por uma bola) e até esquisitos (manequins modernosos sem rosto ou com leite derramado sobre a cabeça), as editoras relembram a sua relação com o processo criativo da revista. Além disso, tem a relação da publicação com o mundo das celebridades, da matéria com Marilyn Monroe pouco antes de sua morte, passando por fotos famosas como a de Elizabeth Taylor furiosa por estar descabelada numa foto antológica, até o nascimento das supermodelos (num período onde Hollywood dizia esnobar a revista e o mundo da moda), ou seja, o filme consegue expor a partir das entrevistas com essas mulheres fascinantes a forma como suas personalidades moldaram a revista (e o mundo?) e vice-versa, seja com ideias simples ou "ousadias" como conjugar alta costura com calças jeans. É genial a cena de início onde elas encontram dificuldades para definir qual é o trabalho de uma editora de moda, até que uma delas ressalta que trata-se da construção de uma imagem marcante. Anna Wintour, atual editora chefe da Vogue Americana, tem participação no filme, mas ela deixa suas editoras brilharem sem pudores. Famosa por seu gênio difícil (basta lembrar que uma ex-assistente escreveu O Diabo Veste Prada), Anna aparece relaxada e ainda tem sua perspicácia mencionada várias vezes ao investir em imagens polêmicas a serem publicadas na revista. Ágil e interessante - até para quem não curte o mundo fashionista -, In Vogue tece um olhar charmoso sobre a sociedade em que vivemos e não podia terminar de forma melhor do que mostrando uma edição recente da revista para uma de suas editoras mais antigas (que completou 100 anos em 2012) - seu olhar é implacável: "Achei horrível essa foto! Eu nem sei se é um menino ou uma menina na capa!". Os anos passam, mas Vogue continua em sintonia com todos os tempos.
In Vogue: O Olhar dos Editores (In Vogue: The Editor's Eye / EUA-2012) de Fenton Bailey e Randy Barbato com Babs Simpson, Grace Coddington, Tonne Goodman, Phyllis Posnick, Hobson Jade, Polly Mellen, Anne Wintour, Camilla Nickerson e Linda Evangelista. ☻☻☻
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