domingo, 13 de janeiro de 2013

NªTV: The Girl


Miller e Jones: suspense psicológico nos bastidores de clássicos de Hitchcock. 

Se Lars von Trier fizesse um filme sobre Alfred Hitchcock não seria muito diferente de The Girl, último filme produzido pelo canal HBO. Tenho minha desconfiança de que se Hitchcock estrelado por Anthony Hopkins foi quase esnobado totalmente pela Academia, tem algo a ver com a qualidade desta produção dirigida por Julian Jarrold. Baseado no livro Spellbound The Beauty, que lançava um olhar sobre a obsessão do diretor com suas musas, o filme mergulha na atração de Hitch por Tippi Hedren - desde o momento em que sua esposa, Alma (Imelda Staunton) sugeriu que desse uma olhada naquela bela modelo com aspirações de conquistar Hollywood. Coube ao filme transformar em imagem aquilo que o livro já dizia, que o diretor ficou tão fascinado pela atriz que cogitou fugir com ela, mas ao ser rejeitado se contentou a tornar a vida dela um inferno dentro e fora da tela. Hedren (vivida por Siena Miller) foi escolhida para o filme posterior à Psicose, Os Pássaros (1963), um dos seus longas menos aclamados na época, ainda que Hitch (interpretado por Toby Jones) o considerasse melhor e mais assustador que o protagonizado por Norman Bates. A figura de Hedren caia como uma luva ao gosto de Hitchcock, de origem sueca (de onde vem seu nome, Tupsa, que significa garota em sueco), sem falar que o fato dela ser divorciada deve ter servido como motivador para as investidas do diretor. No início tudo é perfeito, o cineasta a trata como uma diva - enquanto os outros envolvidos na produção olham com receio aquela modelo que se aventurava a se tornar protagonista de um filme. No entanto, a dedicação à personagem não foi suficiente para satisfazer o cineasta, ao ponto de que a relação tempestuosa entre os dois servisse de motivação para as cenas onde a personagem era perseguida por pássaros  - com direito a ferimentos reais na atriz, especialmente no sufocante ataque final no porão). Essa cena é uma das mais angustiantes do filme, onde o diretor retoma a cena por dezenas de vezes por dias até que Hedren fique totalmente esgotada. No entanto, a ambição de Hedren - e o contrato que havia assinado para protagonizar sete filmes - a motivou a continuar sobre o crivo de Alfred (onde o filme seguinte, Marnie, se tornou a última obra prima do diretor). Não precisa ser muito esperto para notar como Marnie, acusada de frígida pelo seu criador, era inspirada no desprezo de Hedren por Alfred. Essa relação entre os dois torna o filme baseado nos sentimentos conturbados que um sentia pelo outro - onde um alimentava/torturava a auto-estima de outro num jogo perigoso enquanto faziam clássicos do cinema. Os envolvidos na produção eram espectadores da relação entre os dois e a última cena é magistral ao transmitir a sensação de liberdade de sua estrela. Hedren, se destaca entre as estrelas do diretor por ter chegado ao estrelato com dois filmes assinados por ele - tendo recebido o prêmio de atriz mais promissora no Globo de Ouro por Os Pássaros (e hoje é mais famosa por se dedicar a causas humanitárias e ser sogra de Antonio Banderas!). Sobre a produção não há do que reclamar, os cenários, a trilha sonora, os figurinos tudo é perfeito e consegue evocar a atmosfera dos filmes de Hitch com a mesma elegância que as referências à sua obra (escada em espiral, cenas de chuveiro...), mas o destaque fica mesmo por conta da dupla Sienna Miller e Toby Jones. Miller ainda não recebeu a devida atenção em Hollywood, mas aqui (assim como em Factory Girl/2006) ela mostra que tem estômago para ser uma grande estrela. Sua composição de Hedren é espetacular na forma como explora o olhar da personagem e a forma como alcança até a voz de Tippi. Toby Jones é outro, não fosse ter interpretado Truman Capote no mesmo ano que Phillip Seymour Hoffman, provavelmente ele já teria um Oscar na estante. São as atuações da dupla como a bela e a fera dos bastidores do cinema que tornam The Girl imperdível. 

The Girl (EUA/2012) de Julian Jarrold com Sienna Miller, Imelda Staunton, Toby Jones, Penelope Wilton, Carl Beukes e Conrad Kemp. ☻☻☻☻

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