Leo, Gab e Gi: sem fazer ideia que formam um triângulo amoroso.
Houve uma época em que eu adorava assistir curtas metragens nacionais, um dos muitos que vi era sobre um adolescente cego que descobria-se apaixonado pelo garoto novo na escola. Só depois descobri que o curta era premiado e cultuado por muita gente, mesmo assim, eu continuava não achando nada demais no curta. O filme terminava quando os adolescentes começavam o romance e tinha uma amiga que ficava meio de lado na história... a vida de fazer curtas é complicada, já que o tempo limitado deixa a impressão que várias possibilidades a serem exploradas naquele universo ficaram de lado. Por isso mesmo, o cineasta Daniel Ribeiro não deve ter se contentado com aquela mostra do que tinha em mãos e realizou a versão ampliada do curta Hoje eu não quero voltar sozinho, que virou o longa Hoje eu quero voltar sozinho. Com o mesmo elenco do curta, Ribeiro amplia as possibilidades de sua história, mas tem o bom senso de manter seu foco na descoberta de Leonardo (Guilherme Lobo) sobre sua sexualidade. Sem apelar para baixarias, vulgaridades ou sexo explícito, Daniel Ribeiro está preocupado no desenvolvimento dos seus personagens que ainda estão descobrindo quem são de verdade. Os dilemas da adolescência, o jorro de hormônios acoplado à insegurança, a relação com os pais e amigos parece ampliada quando descobrimos que Leonardo é cego. Ele está crescendo, mas sua situação torna ainda mais difícil que as pessoas percebam que ele quer ser independente, descobrir uma forma de conduzir sua própria vida. Isso aparece quando ele pensa em fazer intercâmbio e ir para outro país, outro lugar, onde ninguém o conheça e possa ter até outra personalidade. Embora seus pais sejam bem intencionados, Leonardo cresce sufocado pelo excesso de cuidados, inclusive da amiga Giovana (Tess Amorim) que nutre por ele uma paixão platônica nunca percebida pelos olhares e sorrisos jamais vistos pelo seu amigo. Se diante do universo que gira em torno de Leo começa a haver um desequilíbrio (provocado pelo próprio personagem), o desequilíbrio ganha novo impulso quando a escola recebe Gabriel (Fábio Audi), que torna-se próximo do casal de amigos e cada vez mais de Leonardo (para ciúme de Giovana). O roteiro desenvolve as relações entre o trio adolescente sem pressa, demonstrando em pequenos gestos a intensidade da relação que cresce gradativamente. Apresentados como pessoas comuns, os personagens vão aos poucos sendo delineados pelas atuações e termina no encontro com o curta lançado em 2010 de forma coerente com as intenções do autor: contar uma história de amor. Nesse ponto, é interessante a opção de ter um protagonista cego, mostrando outras nuances sobre a percepção da sexualidade envolvendo a afetividade e a atração física como algo para além da aparência. Porém, senti falta do posicionamento dos pais com relação ao desfecho, talvez o diretor saiba que estragaria o sabor adocicado de seu final com novas problemáticas. O filme ganhou dois prêmios no Festival de Berlim em 2014 (o da crítica e o Teddy Bear - voltado para o público GLBT) e existe uma petição liderada por Martha Suplicy para o filme ser o indicado a concorrer uma vaga no Oscar de filme estrangeiro em 2015 - e sim, ele tem chances, já que o filme coleciona prêmios em todos os festivais em que foi exibido. Se acontecer, será o nosso melhor candidato há tempos.
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (Brasil/2014) de Daniel Ribeiro com Guilherme Lobo, Fábio Audi, Tess Amorim e Eucir de Souza. ☻☻☻☻
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