Jude: o mundo é feito de som e fúria!
Quando Jude Law começou a aparecer no cinema no início da década de 1990, era uma unanimidade de que era um dos atores mais belos de sua geração. Não demorou para o jovem ator inglês chegar em Hollywood e ser indicado ao Oscar de coadjuvante como o cobiçado egocêntrico Dickie Greenleaf de O Talentoso Ripley (1999), objeto de desejo e cobiça de Tom Ripley (vivido por Matt Damon). Embora seu talento fosse indiscutível, a beleza de um ator muitas vezes pode atrapalhar na condução de uma carreira. Jude escolhia papéis dramáticos que o desafiassem (e um até lhe rendeu outra indicação ao Oscar, dessa vez na categoria de ator principal por Cold Mountain/2003) e, vez por outra, passava por transformações físicas para que seu talento se sobreposse à estampa que Deus lhe deu (como em Estrada para Perdição/2002, Fúria/2009 e Contágio/2011), mas era visível que para não ser posto na posição de galã, Jude investia no exagero, tanto que ficou com a carreira numa espécie de ponto morto. Sua carreira tomou novo fôlego quando depois de encarnar o parceiro de Sherlock Holmes/2009, seu maior sucesso de bilheteria - mas que lhe garantiu participações pequenas em vários filmes. Seu maior destaque recente foi como o marido traído (e barbudo) de Anna Karenina (2012). Via-se que o ator não era o mesmo, o passar dos anos começavam a dar sinal e Jude estava mais confortável com as marcas de expressão e o cabelo que rareava aos poucos. Portanto, assistir sua atuação como Dom Hemingway nesse A Recompensa é o amálgama de tudo que Jude queria fazer numa tela, mas sempre lhe parecia impossível - pelo menos, até o momento. Todo o exagero que citei acima, aparece canalizado em um personagem estapafúrdio, que cospe sua fúria com palavrões e grosserias como se estivesse citando Shakespeare (basta ver a cena de abertura onde realiza uma ode inusitada à própria genitália), sem falar que o tempo deu ao ator a aparência certeira para viver o ex-presidiário que passou doze anos na cadeia por não entregar o cabeça do seu bando de assaltantes, Mr. Fontaine (Demian Bichir). No entanto, Fontaine sabe que tem uma dívida com o ex-parceiro, que o procura para receber a quantia de dinheiro que considera lhe ser de direito. Nessa busca pela grana, Hemingway conta com a companhia de um amigo dos tempos idos, Dickie Black (Richard E. Grant) que é cool o suficiente para equilibrar a visão que Dom tem do mundo (uma lente sórdida muito peculiar - e em volume bastante alto) estaria no lugar certo se essa não fosse só a primeira parte do filme, já que existe uma segunda, anunciada num corte narrativo é quase um marco do humor negro. Ali, todo plano do protagonista vai por água abaixo e ele precisa enfrentar seu fantasma mais doloroso do passado: uma filha - Evelyn (Emilia Clarke). Cheia de ressentimentos, os encontros espinhosos dos personagens faz com que o resgate do relacionamento com Evelyn seja o mais importante para o protagonista nessa segunda parte. É verdade que o diretor Richard Shepard (que antes dirigiu o divertido O Matador/2005 com Pierce Brosnan) não tem o traquejo necessário para lapidar essa mudança de foco brusca na narrativa, quando Hemingway cai em desgraça, sorte dele que Jude Law costura essas duas camadas distintas com bastante desenvoltura. Seu Dom Hemingway é um anti-herói irresistível! O ator consegue até que torçamos por ele nos momentos mais arriscados (como quando ele tenta arrombar um cofre da forma mais primitiva possível - numa das cenas mais tensamente hilárias do filme). Debaixo de todo humor negro A Recompensa é uma história marginal de redenção com algum charme e, além disso, mostra que Jude Law está maduro como ator, o suficiente para não deixar a essência do seu personagem desaparecer atrás de sua máscara de bad boy, trejeitos ou uma manobra arriscada da narrativa que o cerca.
A Recompensa (Dom Hemingway/Reino Unido-2013) de Richard Shepard com Jude Law, Richard E. Grant, Emilia Clarke e Demian Bichir ☻☻☻
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