Domésticas: o cartão de apresentação de Fernando Meirelles.
Depois de patinar com o pretensiosamente oco 360 lançado em 2011, Fernando Meirelles tem investido cada vez mais em trabalhos para a televisão, tanto que desde então seu único trabalho para o cinema foi no episódio "A Musa" do longa Rio, Eu Te Amo (2014). É engraçado que nessa espécie de hiato eu tenha visto seu primeiro longa metragem: Domésticas. Há de se dizer que o filme mal teve tempo de ser descoberto, já que pouco depois o diretor lançou o famigerado Cidade de Deus (2001), que deixou claro que no cinema brasileiro existia a possibilidade de criar uma obra de qualidade irrepreensível, digna de ser reconhecida mundialmente. Baseado na peça de Renata Mello, Domésticas é composto de pequenas histórias entrelaçadas sobre o cotidiano de um grupo de empregadas de São Paulo. As tramas são contadas com muito humor e com um olhar particular para as personagens que geralmente se reduzem a coadjuvantes na dramaturgia mundial. As histórias são costuradas por algumas cenas que parecem documentais, onde os atores olham diretamente para a câmera e tecem comentários como se fossem entrevistas. O elenco é excelente e chama a atenção para personagens como Roxane (Graziela Moretto) que sonha em ser modelo, Créo (Lena Roque) que tem problemas com a filha que não quer seguir na profissão, Rai (Cláudia Missura) que sonha em casar, Quitéria (Olivia Araújo) que não consegue estabilidade com patroa alguma e Cida (Renata Melo) que enfrenta problemas no casamento. Misturado às personagens femininas estão os homens que ajudam a compor um universo interessante. Existem cenas impagáveis como a que Créo procura ajuda com um pai de santo ou nas desventuras de Roxane num dilema com a profissão mais antiga do mundo. Com diálogos espirituosos (que tentam se equilibrar numa linha finíssima entre o divertido e o preconceituoso) e trilha sonora brega, Fernando Meirelles já demonstrava aqui sua preocupação técnica com a narrativa e o desenvolvimento dos personagens. Além disso, existe um subtexto social muito interessante nas situações que os personagens atravessam. Bem fotografado, editado e filmado, o diretor já demonstrava sua inquietação em busca da construção de uma narrativa mais moderna do que os diretores brasileiros estavam acostumados. Domésticas pode até não ser perfeito, mas consegue ser um dos filmes mais divertidos que o Brasil já produziu nesse século.
Domésticas (Brasil/2001) de Fernando Meirelles com Olivia Araújo, Graziela Moretto, Cláudia Missura, Renata Melo, Tiago Moraes, Robson Nunes, Gero Camilo, Roberta Garcia, Cecília Homem de Mello e Luís Miranda. ☻☻☻☻
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