Katherine e Joaquin: paródia noir setentista.
Devo confessar que fui assistir ao novo filme de Paul Thomas Anderson com baixa expectativa. Afinal, fiquei realmente escaldado com O Mestre, que das expectativas pós Sangue Negro/2007, revelou-se uma egotrip cansativa acima de todas as suas alardeadas qualidades. O efeito disso para quem ofertou seu coração ao cineasta após ver Boogie Nights/1997 e Magnólia/1999 não era fácil de ser digerido. Então vieram todas aquelas informações sobre a adaptação do diretor para a obra (dita inadaptável) Inherent Vice de Thomas Pynchon. Some às críticas complicadas no lançamento do filme e você poderá imaginar como eu esperava pouco do novo filme de Paul. Talvez tudo que estava contra ele tenha ajudado à apreciação dessa viagem noir lisérgica do diretor. O filme conta a história do detetive Larry "Doc" Sportello (Joaquin Phoenix), que recebe a visita de sua ex-namorada Shasta Fay Hepworth (Katherine Waterston) que se envolveu com um casal milionário metido em tramoias. Não demora para que Shasta desapareça e Doc considere uma questão de honra encontrá-la. Esse é o pretexto para o personagem encontrar com uma verdadeira fauna setentista, como uma ex-viciada em heroína com dentes enormes (Jena Malone) que não sabe o paradeiro do esposo (Owen Wilson) - que torna-se o informante misterioso de Doc -, prostitutas que sabem mais do que deviam e outros personagens que estão lá mais para apontar para direções (que logo poderão ser abandonadas) ou simplesmente complicar mais ainda a vida de Doc - como o estranho policial "Bigfoot" Bjornsen (Josh Brolin, que muita gente acreditava que seria indicado ao Oscar pelo papel) ou outros tantos sujeitos com nomes bizarros (Adrian Prussia, um advogado chamado Sauncho Smilax, uma patricinha doidona chamada Japonica Fenway, um brutamontes chamado Puck Beaverton, sem falar em Chlorinda, Sortilège, Petunia, Amethyst...). Quem não perder tempo buscando sentido na trama apreciará o longa muito mais do que quem levar a sério todo o mistério que o filme sugere existir. Vício Inerente foi acusado de ser confuso, mas convenhamos que dez entre dez filmes noir são confusos com o seu emaranhado de crimes e personagens e, desse emaranhado, que surge o que o gênero possui de mais envolvente. O fato é que ao ambientar a busca de seu detetive viajandão na década de 1970, com personagens hippies, teorias conspiratórias, drogas, nazistas (?!) e sexo livre, todos os elementos do gênero ganham uma cara nova que beira a paródia. Todos os elementos noir estão lá, como o detetive confuso (ainda mais com o uso constante de maconha - e talvez por isso Robert Downey Jr. tenha abandonado o papel, já que agora seu passado doidão ficou para trás e é bom ninguém lembrar dele...), a femme fatale (numa atuação nasce-uma-estrela de Katherine Waterston), policiais corruptos, informantes escorregadios, pistas falsas... no entanto, não existe suspense a produzir, apenas uma espécie de brincadeira do diretor com todos esses signos na construção de um painel imaginário de sua adorada Los Angeles através da escrita de Pynchon. O Oscar entendeu o recado e indicou Anderson ao prêmio de roteiro adaptado (além de indicar o filme ao prêmio de melhor figurino). Vício Inerente me agrada mais do que a pompa de O Mestre, sua estranheza é mais pulsante do que o tom morno exibido naquele filme. Além disso, o fato de Paul Thomas Anderson conseguir atores de prestígio para participações especiais inusitadas em seu filme (Benício Del Toro, Reese Witherspoon, Maya Rudolph, Eric Roberts, Martin Short...), prova que o moço está cada vez mais próximo de seu ídolo, Robert Altman - além disso, faz esse humilde fã respirar aliviado diante da criatividade de um dos seus cineastas favoritos.
Vício Inerente (Inherent Vice/EUA-2014) de Paul Thomas Anderson com Joaquin Phoenix, Katherine Waterston, Josh Brolin, Joanna Newson, Owen Wilson, Reese Witherspoon e Maya Rudolph. ☻☻☻☻
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