quarta-feira, 7 de setembro de 2016

CICLO VERDE E AMARELO: A Marvada Carne

Adilson e Fernanda: romance (quase) folclórico. 

André Klotzel está entre os meus cineastas favoritos, pena que ele filma pouco. Com quatro filmes no currículo, o diretor chamou atenção desde sua estreia com o premiado A Marvada Carne (e com o sotaque interiorano fica ainda mais gostoso de dizer esse título)! O mais incrível é que três décadas depois, o filme ainda se garante (com facilidade) entre uma das obras mais interessantes do nosso cinema. Em 1985, Klotzel deliciou o público com a história de amor entre Quim (o ótimo Adilson Barros) e Carula (Fernanda Torres em início de carreira), uma história que se passa no interior do Brasil e está repleta de referências ao folclore brasileiro... mas não espere um filme didático e que força a mão para inserir personagens como Mulher Diaba (Regina Casé cheia de nuances) ou Curupira (Nelson Triunfo) de forma gratuita, todos estão inseridos de forma divertida numa história que parece uma espécie de versão de Ulisses para uma realidade brejeiramente brasileira. Afinal, se Quim tem como maior objetivo comer um pedaço de carne pela primeira vez, Carula quer apenas conhecer o homem de sua vida (nem que para isso tenha que torturar a estatueta de Santo Antônio até o limite - e a cena clássica das bolhas de ar saindo do santinho é de rolar de rir). É meio que por acaso que os caminhos de Quim e Carula se cruzam e a partir daí, ele terá que provar que é um homem digno de casar-se com aquela moça de família bastante tradicional. Klotzel usa e abusa do bom humor, sempre temperado com uma pitada de fantasia, encontrando amparo de um excelente roteiro (onde termos como "melúria" e "turina" não são de se rejeitar) e um ótico elenco (que precisa dar conta de um sotaque tão carregado que merecia até legenda em algumas cenas). Após tantos desafios enfrentados, talvez a maior adversidade de Quim seja quando ele vai para cidade grande e a realidade econômica do Brasil da década de 1980 vem à tona com seus congelamentos, produtos escassos e saques em supermercado (sem falar na esperteza brejeira dos personagens que é substituída pela malícia da cidade grande - encarnada por Chiquinho Brandão). O desfecho urbano e centrado na periferia mostra que A Marvada Carne estabelece uma espécie de transição entre dois mundos bastante específicos de nosso país e se estabelece como um filme que sempre gosto de rever e que indico para todas as pessoas que curtem um cinema nacional vigoroso e criativo (e adoraria que Klotzel, que não lança um filme desde Reflexões de um Liquidificador/2010 lesse essa humilde apreciação e voltasse a dirigir).

A Marvada Carne (Brasil-1985) de André Klotzel com Adilson Barros, Fernanda Torres, Dionísio Azevedo, Chiquinho Brandão, Regina Casé, Tio Celso, Tonico e Tinoco. ☻☻☻☻☻

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