domingo, 13 de dezembro de 2020

PL►Y: O Mistério de Silver Lake

 
Andrew: um desocupado e suas teorias conspiratórias. 

No terror A Corrente do Mal (2014) o americano David Robert Mitchell fez bonito ao fugir do óbvio chamando atenção do público, da crítica e das premiações pela forma ousada com que contava a história de uma maldição sexualmente transmissível. Ali até a posição da câmera motivava a paranoia dos personagens e do espectador. Com fama anabolizada e mais dinheiro para seu projeto seguinte, David criou este O Mistério de Silver Lake que foi até indicado à Palma de Ouro em 2018 no Festival de Cannes e dividiu opinião ao redor do mundo com uma história que transborda referências e por vezes se embola nas próprias intenções de fazer uma espécie de neo-noir bem humorado sobre o submundo de Hollywood. O protagonista desta mistura é Sam (Andrew Garfield), um rapaz que mora nos arredores da capital do cinema que anda de carrão por aí, mas não tem emprego ou dinheiro para pagar o aluguel. Ele passa os dias espionando as vizinhas e esperando fazer algum sexo com as mulheres que cruzam seu caminho. Sem muito o que fazer ele acaba se aproximando de uma nova vizinha, Sarah (Riley Keough) que tão logo desperta seu interesse... desaparece no dia seguinte. A partir daí, Sam começa a investigar o paradeiro de sua amada, mergulhando num mundo de teorias da conspiração, lendas urbanas, mensagens subliminares e códigos escondidos. Some a isso celebridades desaparecidas, um assassino de cachorro e uma mulher coruja e você terá uma ideia dos elementos que Mitchell mistura a todo instante no seu roteiro por duas horas e vinte minutos. Existe aqui um certo tempero de cultura pop (o pôster de Kurt Cobain, a trilha sonora, as músicas citadas pelo compositor misterioso...) e um punhado de alusões a porcarias que ganham espaço na internet. A vida de Sam é tão sem rumo que ele busca algum significado secreto na vida para conseguir dar algum sentido aos seus dias - mesmo que para isso ele invente e reinvente lógicas e padrões que por vezes não fazem sentido nem mesmo na sua cabeça. Embora busque sempre um equilíbrio entre os mistérios e tom de comédia, o que prevalece é o estranhamento perante a história que em sua reta final tenta costurar algumas pontas para dar sentido ao que parecia apenas surreal. Entre seitas estranhas, túneis secretos e atrizes fracassadas que se prostituem, o filme rendeu comparações com Cidade dos Sonhos (2000) de David Lynch, que embora possa até ser uma referência do filme, Mitchell ainda precisa comer muito feijão com arroz para fazer um terço do que Lynch alcança em seus filmes. Em vários momentos Silver Lake perde o fôlego e a chance de surpreender o espectador para joga-lo no labirinto autoindulgente em que coloca seu personagem principal. É interessante ver Andrew Garfield num personagem que desconstrói a imagem de bom moço que Hollywood construiu para ele, mas a novidade não se sustenta por muito tempo quando ele não tem muito o que fazer além de ser um rapaz sem planos ou perspectivas atrás de uma garota que não está nem aí para ele. O Mistério de Silver Lake termina como um retrato de uma galera que na falta do que fazer inventa sentidos escondidos em matérias de jornal e discos a serem ouvidos de trás para frente e igualmente, portanto, carece de rumo.   

O Mistério de Silver Lake (Under the Silver Lake / EUA -2018) de David Robert Mitchell com Andrew Garfield, Riley Keough, Topher Grace, Deborah Geffner, Tucker Meek e Wendy Vanden Heuvel. ☻☻

Nenhum comentário:

Postar um comentário