A primeira vez que ouvi falar de A Tabacaria foi através de um adolescente que recomendou que eu o assistisse. Era meados do ano passado e eu nunca tinha ouvido falar do filme. A definição dele sobre a história foi bastante simples: "é sobre um adolescente que trabalha na tabacaria em que Freud compra os charutos". Na mesma hora imaginei uma pessoa que olha para uma foto do pai da psicanálise com um charuto na mão e imagina o lugar em que ele comprava aquilo. Também pensei em como para um adolescente (em meio a todos os dilemas existenciais e hormonais) a ideia de ter Freud como uma pessoa próxima seria fascinante. Na verdade estes dois pontos devem ter passado pela cabeça do escritor Robert Seethaler quando a ideia de seu livro mais conhecido brotou em sua cabeça. O protagonista da história é Franz (o promissor Simon Morzé), que aos 17 anos sai do interior da Áustria para trabalhar no estabelecimento do título que fica na grande Viena. O mocinho vai para lá com a indicação da mãe (Regina Fritsch) que é uma antiga conhecida do proprietário, o simpático Otto (Johannes Krisch). Não demora muito para que Franz conheça o professor Sigmund Freud (Bruno Ganz), que começa a ganhar notoriedade com seu trabalho no campo do estudo da mente humana. Desde o início Franz busca se aproximar do professor, instigado principalmente por seu interesse amoroso em uma dançarina chamada Anezka (Emma Drugunova) que é bem mais experiente e desinibida que ele. Diante desta premissa, para além do relacionamento que se estabelece entre estes personagens existem outros dois pontos com destaque: um é o período histórico que o filme retrata, tendo a grande tensão da ascensão nazista na Alemanha, que envia ecos de seu discurso antissemita ao país vizinho e acarreta acontecimentos em torno da tabacaria. Não demora muito para que pessoas um tantinho mais esclarecidas percebam que existe algo de errado naquele discurso hitlerista, mas a pressão social sobre estes se torna insuportável. Diante disso, não pude deixar de notar que em algumas cenas o filme se escora em algumas cenas de Cabaret/1972 de Bob Fosse para criar o ambiente em que Anezka ganha a vida. Para além deste contexto histórico, o diretor Nikolaus Leytner oferece bastante destaque aos sonhos do jovem protagonista, compondo verdadeiros enigmas ao longo da narrativa, mas que não chegam a ser explorados de maneira óbvia no decorrer da história. É evidente que existe muito de desejos reprimidos (óbvio) nestas cenas (e Simon Morzé demonstra ser bastante desinibido em exibir seu corpo para a câmera) além de uma analogia com o que acontece no decorrer da narrativa conduzida sem pressa. A sessão começa simpática e bem-humorada para depois ganhar contornos cada vez mais sérios rumo ao desfecho. O filme é bastante valorizado por Bruno Ganz em mais um momento marcante na pele de uma figura histórica (e deixa ainda mais triste a sua despedida em fevereiro do ano passado), o ator confere bastante credibilidade a esta trama sobre o amadurecimento de um garoto em meio à um dos períodos mais sombrios da História mundial.
A Tabacaria (Der Trafikant / Áustria - Alemanha / 2018) de Nikolaus Leytner com Simon Morzé, Bruno Ganz, Johannes Krisch, Emma Drugunova e Regina Fritsch. ☻☻☻☻
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