Iandhir e Débora: poesia na aridez do sertão.
Ganhador de vários prêmios em festivais brasileiros, o pernambucano A História da Eternidade era um dos fortes candidatos a conseguir a vaga para representar o Brasil no Oscar do ano que vem (A Que Horas Ela Volta de Anna Muylaert foi o escolhido para a disputa). O primeiro longa de ficção de Camilo Cavalcante chama a atenção pela forma como insere poesia na aridez do sertão - o que o torna bem distante do estilo de Claúdio Assis e sua visão sórdida sobre a região nordeste. Ainda que Camilo invista em histórias ásperas de se assistir, ele busca um equilíbrio dosado na esperança de seus protagonistas. Suas histórias se passam num vilarejo com poucos habitantes e alguns acontecimentos que prometem mudar suas vidas pela via, nem sempre segura, do desejo. Assim, conhecemos João (Irandhir Santos), um ator que se contenta em fazer apresentações nas ruas, embora seu trabalho seja incompreendido pela maioria dos habitantes - incluindo seu irmão Nataniel (Claudio Jaborandy), que matuto que só, não consegue diferenciar o trabalho do irmão da função de um palhaço. João vive próximo ao irmão e dos cinco sobrinhos, quatro rapazes (que não recebem muito destaque na história) e Alfonsina (Débora Ingrid), a única mulher do clã que precisa dar conta dos afazeres da casa enquanto sonha em ver o mar. Alfonsina é a fã número um de seu tio e, percebe nele, uma forma de encontrar um pouco de alento na secura que existe por ali. O filme acompanha ainda duas outras personagens femininas às voltas com a chegada de homens em suas vidas. Uma é Querência (Marcélia Cartaxo), que aparece devastada depois que a morte carregou sua única companhia. Endurecida pela vida, Querência começa a receber atenção do sanfoneiro cego (Leonardo França) que vive na cidade. No início ela fica desconfiada, mas depois começa a sentir-se envaidecida por ser desejada novamente. A outra ponta da narrativa é dedicada à Dona das Dores (Zezita Matos) uma idosa, viúva que recebe a visita do neto Geraldo (Maxwell Nascimento), que resolve visitá-la depois de anos vivendo em São Paulo. Embora ela estranhe o estilo do moço (brincos, tatuagem, revistas impróprias...) é notável como ela canaliza todo o seu afeto para o rapaz. O filme é contado dividido em três partes de nomes um tanto irônicos (Pé de galinha; Pé de Bode; Pé de Urubu), que tem mais relação com as partes que nomeias do que você imagina. No entanto, a história das três personagens femininas são contadas quase de forma independente, de forma lenta e contemplativa, até que seja interrompida por algumas cenas viscerais na vida de cada uma. Os mais cínicos irão achar um tanto ingênua a forma simples como Camilo Cavalcante aborda os dramas de seus personagens, mas ainda assim, devem concordar, que existem alguns momentos memoráveis, seja com João cantando Secos e Molhados em meio ao sol escaldante ou com Alfonsina fechando os olhos para sentir conforto no som do mar na última bela cena do filme. Composto por personagens que tentam sobreviver a um deserto não apenas geográfico, mas, também, emocional, A História da Eternidade consegue ser bastante sensível em seu desenvolvimento.
A História da Eternidade (Brasil/2014) de Camilo Cavalcante com Débora Ingrid, Irandhir Santos, Marcélia Cartaxo, Zezita Matos, Maxwell Nascimento, Claudio Jaborandy e Leonardo França. ☻☻☻
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