O elenco: Réquiem para um canibal.
Foi ao ar nesta quinta-feira, pelo canal AXN no Brasil, o 13º episódio episódio da terceira temporada de Hannibal - ou o trigésimo nono e derradeiro capítulo de uma das séries mais perturbadoras que a TV já ousou produzir. Um labirinto psicológico cheio de personagens complexos calcados no universo que o escritor Thomas Harris criou para seu personagem mais famoso, o canibal Hannibal Lecter. Com seus litros de sangue, fotografia escura, requintes de crueldade e jogos repletos de manipulações, transtornos e morbidez, a série foi cancelada por seus baixos índices de audiência. É verdade que a série melhorou muito em sua segunda temporada, onde aprofundou o relacionamento obsessivo entre o psicanalista Hannibal Lecter (Mads Mikkelsen) e o comportamentalista Will Graham (Hugh Dancy). Foi na segunda temporada que a série entrou nos eixos, com a medida certa entre ousadias na profundidade de seus personagens que se sentiam cada vez mais atraídos pelo mal encarnado no personagem. Pena que na terceira temporada os cinco primeiros episódios tenham se arrastado demais sobre o tempo em que Hannibal viveu escondido na Itália - após promover um verdadeiro massacre com os outros personagens no final da temporada anterior. Depois das vertigens do episódio anterior, a repetição de climas contemplativos no início da temporada pesou na audiência. Imagino que nesse período que o criador da série para a TV, Bryan Fuller, sofreu ainda mais críticas de quem percebia que ele cozinhava demais a história do livro Dragão Vermelho em que se baseia. Foi neste livro de Thomas Harris que Hannibal apareceu pela primeira vez, ainda como coadjuvante, para somente depois ser aprofundado em O Silêncio dos Inocentes e cair no exagero ao ser promovido a protagonista em Hannibal e Hannibal Rising. Nota-se que durante boa parte da série, Fuller criou uma estrutura para a história que acontece antes da trama do livro. A história do Dragão Branco ficou restrita aos seis últimos episódios do programa, mas não comprometeu a série de ter identidade própria. Diante da mudança brusca que a terceira temporada sofreu a partir do sexto episódio, fica evidente que tentaram salvar o programa quando as ameaças de cancelamento tornaram-se mais concretas e a trama do serial killer conhecido como Fada do Dente nem dava sinais no desenvolvimento da série.
Rutina e Richard: a química entre a Bela e a Fera.
Antes de abordar a história do Dragão, Fuller ainda percebeu a necessidade de amarrar algumas pontas soltas da temporada anterior, como as estranhezas dos irmãos Verger (abordados em dois episódios concisos, mas eficientes). Sorte que quando dedicou-se ao livro de forma efetiva, o programa contou com as atuações inspiradas do britânico Richard Armitage e Rutina Wesley para dar conta da abordagem um tanto apressada dos personagens. Armitage soube criar um discípulo perfeito de Hannibal, conseguindo ser tão sedutor quanto assustador em suas nuances (mais e menos) sombrias, ao mesmo tempo, o programa se beneficiou muito em bancar um relacionamento inter-racial de química tão certeira que nem parecia uma dessas adaptações étnicas feitas para ser politicamente correta. Nos capítulos em que dividiam a cena, Armitage e Rutina Wesley (que viveu sua amada deficiente visual) garantiam uma energia em cena tão grande que rivalizava com a tensão entre Hannibal (que estava preso) e Will (que relutava em voltar a colaborar com o FBI). O casal garantiram a integridade do programa depois da guinada necessária após os sonolentos capítulos iniciais. Com o fim do programa, por mais que Fuller alardeasse que procurava uma nova casa para seu programa, torna-se óbvio que, ao ser baseado em Dragão Vermelho, o material do seu criador termina exatamente aqui - ainda que o final deixe uma conclusão em aberto sobre a tensão sexual crescente entre Will e Hannibal (seria uma metáfora a cena do abismo ou seria real? Diante de tudo que a série fez eu nem sei dizer, mas funcionou!). A partir daqui o que segue é a história de outro livro (O magistral O Silêncio dos Inocentes), ainda que elementos dos outros livros estivessem presentes na série, algo me diz que direitos autorais pesaram nessa hora. Resta dizer que enquanto foi ao ar, Hannibal cumpriu seu papel, ainda que a temporada conclusiva tenha demorado para engrenar, a segunda fase foi salutar para o programa e apenas ressaltou suas qualidades. Enquanto a série não encontra uma nova casa, resta-nos celebrar a coragem e o talento do dinamarquês Mads Mikkelsen que em momento algum pareceu intimidado em devorar o personagem imortalizado por Anthony Hopkins nos cinemas. Seu Hannibal tinha personalidade própria e era infinitamente mais sedutor perante mulheres e homens. Penso que a série possa ser retomada em breve e, com seu hábito de ler nas entrelinhas, possa buscar explicação para o fim de Will, que desaparece na saga ao final do livro que serviu de base para a série. Na nova temporada poderia aparecer Clarice (a personagem vivida por Jodie Foster no cinema) pela primeira vez? Ou serviria para desenvolver ainda mais as marcas deixadas na gélida Drª Bedelia Du Maurier (Gillian Anderson) ou em Frederick Chilton (Raúl Esparza)? O fato é que a partir daqui, resta ao espectador esperar alguém disposto a bancar as ousadias do programa e retomar a série que limpou o nome do canibal mais famoso de todos os tempos de mancharem seu nome no cinema.
Hannibal e Will: abraçados para sempre?
Hannibal - Terceira Temporada (EUA/2015) criado por Brian Fuller com Mads Mikkelsen, Hugh Dancy, Richard Armitage, Rutina Wesley, Gillian Anderson, Lawrence Fishburne e Katharine Isabelle. ☻☻☻
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