Stewart e Kelly: os favoritos de Hitchcock.
Eu tinha até vergonha quando contava que nunca vi Janela Indiscreta, um dos maiores clássicos de Alfred Hitchcock. Mais do que um clássico, o filme tornou-se uma referência no gênero - gerando refilmagens, ensaios fotográficos e filmes que se inspiraram nele (como Dublê de Corpo/1984 de Brian DePalma). O fato é que filme bom não tem idade e, como já disse outras vezes aqui no blog, os filmes de Hitch sempre me surpreendem pela modernidade com que são realizados. Existem alguns planos de Janela Indiscreta que beiram o inacreditável se pensarmos que foi realizado há 60 anos! Além disso, o desenho dos personagens são sempre mais instigantes do que imaginamos - especialmente se levarmos em consideração o relacionamento moderninho que existe entre o casal principal vivido por James Stewart e Grace Kelly (o casal favorito do diretor). James é Jeff, um fotógrafo que encontra-se em repouso em seu apartamento, confinado à uma cadeira de rodas. Para passar o tempo, ele vive espiando o cotidiano de seus vizinhos como um autêntico voyeur. O hábito de Jeff é criticado por sua empregada (Thelma Ritter) e pela namorada, Lisa Fremont (Grace Kelly) que não veem com bons olhos seu interesse pela vida alheia. Essa curiosidade pela intimidade dos outros incomoda ainda mais a bela Lisa, que ainda tenta convencer o seu amado a avançar no relacionamento que existe entre eles. Em algumas cenas, Jeff demonstra se considerar superior ao estilo de vida de Lisa, que escreve em revistas de moda e frequenta festas badaladas - o que a irrita algumas vezes. Para além das discussões que seu mau hábito gera, Jeff começa a desconfiar que um dos moradores do prédio em frente à sua janela assassinou a esposa. Juntando evidências visuais enquanto se recupera da perna ele não tem dúvidas de que algo de sinistro aconteceu em uma determinada noite. Embora conte com a ajuda do amigo detetive Thomas (Wendell Corey), tudo também pode ser fruto de sua imaginação - ainda que Lisa, aos poucos, comece a ter as mesmas desconfianças e resolva ajudá-lo a descobrir a verdade, colocando a vida de todos em risco. Hitchcock é um mestre de orquestrar atmosferas de suspense que crescem gradativamente e aqui a novidade é o cuidado em que explora o cotidiano de uma dezena de personagens que não possuem diálogos, mas movimentos explorados pelo expectador através dos olhos de Jeff. Existe uma bela coreografia entre as cenas que mesclam o cotidiano dos personagens, o que consegue manter nosso interesse em suas existências aparentemente triviais (destaque para a Miss Lonelyhearts de Judith Evelyn, que vive no limite da solidão todos os dias). Além de todas as qualidades técnicas, reguladas pelo famoso perfeccionismo do diretor, o filme ainda tem uma Grace Kelly que beira uma miragem de tão linda. Percebe-se em sua primeira cena como a atriz precisou apenas de seis anos para se tornar uma lenda em Hollywood. Aqui ela está em sua segunda parceria com Hitch e honra as protagonistas impecáveis do diretor como se fosse uma espécie de deusa em celulóide (e, a cada cena, percebemos porque o diretor ficou tão desapontado quando a musa largou a carreira de atriz para se casar com o príncipe de Mônaco), dizem que na intimidade ele sempre dizia que a tornaria a maior estrela de seu tempo (e as cenas em que ela aparece só comprova essa devoção do cineasta).
Janela Indiscreta (Rear Window/EUA-1954) de Alfred Hitchcock com James Stewart, Grace Kelly, Thelma Ritter, Wndell Corey e Raymund Burr. ☻☻☻☻
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