Clive Owen e seus herdeiros: rito de passagem para todas as idades.
O cineasta Scott Hicks tem uma verdadeira maldição em seu currículo, esta maldição se chama Shine (1996), badalado filme australiano de 1996 que concorreu nas principais categorias do Oscar (premiando seu protagonista Geoffrey Rush). Você deve estar se perguntando o que um filme tão aclamado tem de maldição para seu diretor... é bem simples, desde que lançou aquele filme, há quase vinte anos, Hicks não lança um sucesso equivalente. Nem adianta ele assinar produções simpáticas como a refilmagem Sem Reservas (2007) ou este Os Garotos Estão de Volta. Desprezado pela crítica o filme poderia ter encontrado fãs fiéis se fosse assinado por um diretor independente de pretensões despojadas, mas como foi assinado por Hicks passou em branco nos festivais internacionais e foi lançado direto em DVD por aqui. A presença de Clive Owen pode até chamar a atenção de parte do público - que pode se surpreender com uma atuação bem diferente da que costuma fazer. Owen interpreta Joe Warr, um cronista esportivo que trocou a Inglaterra pela Austrália depois de se apaixonar por uma amazona, Katy (Laura Fraser). A verdade é que Joe quase não convive com a esposa e o filho, Artie (Nicholas McAnult) por estar sempre viajando a trabalho. As coisas vão mudar quando Katy adoecer e falecer poucos meses depois. Sem Katy por perto, Joe terá que rever suas prioridades e se dedicar mais tempo à carreira profissional ou à vida paterna. Após a perda, Joe está tão perdido quanto seu filho e não vai demorar muito para que estabeleça regras de convivência que deixarão a casa numa verdadeira bagunça. Warr é mostrado como um pai desencanado com regras e se preocupa mais em ser amigo do filho do que construir uma figura de autoridade. Se ele começa a dar conta do filho, logo ele receberá a visita de seu primogênito, Harry (George MacKay), fruto de seu primeiro casamento deixado na Inglaterra com a mãe amargurada. Harry é um adolescente inglês típico e fica evidente o choque com toda aquela liberdade encontrada na casa do pai em contraste com a educação repressora que teve ao lado da mãe. Conforme o trio convive, alguns conflitos aparecem - assim como alguns problemas de percurso que não valem ser mencionados para não estragar a surpresa. Há gente que se incomoda com as tintas liberais com que o personagem de Owen é mostrado, mas elas até fazem sentido conforme o filme sugere como foi sua adolescência num taciturno colégio interno inglês. Eu achei interessante como a certa altura o filme parece um ritual de passagem não só para os filhos como para o pai também. Fica claro que todos precisam aprender a viver juntos e a construir as regras para a nova estrutura familiar que compõem. Se Hicks não aprofunda muito algumas situações deixando tudo a um passo do melodrama (como o relacionamento de Joe com a sogra que pretende preencher o espaço deixado pela filha com a guarda do neto), por outro lado, o diretor consegue lançar um olhar agridoce original neste tipo de filme, sem edificar ou criticar seus personagens. Se um confortável Clive Owen é o nome mais famoso do elenco, quem surpreende é o ruivinho George MacKay que interpreta Harry. Em atuação contida ele é responsável por alguns dos melhores momentos do filme. Pela proeza ele chegou a concorrer a prêmios de artista mais promissor pelo British Independent Film Awards e Pela Associção dos Críticos de Londres. Adaptado do livro de Simon Carr, o filme pode não ser brilhante, mas está longe de merecer o desprezo que recebeu nos cinemas.
Os Garotos Estão de Volta (The Boys are Back/Autrália-Reino Unido/2010) de Scott Hicks com Clive Owen, George MacKay, Emma Booth, Julia Blake e Nicholas McAnulty. ☻☻☻
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