Martin e Shia: pretensiosamente tedioso.
Na estreia de Ninfomaníaca, a atriz Charlotte Gainsbourg disse que na primeira vez em que o diretor Lars von Trier comentou sobre o filme, ela acreditou que era apenas uma piada provocadora. Somente depois, quando recebeu o roteiro que percebeu que o diretor estava falando sério. Conforme a produção ganhava forma o filme recebia mais destaque na mídia. Cada aquisição do elenco, cada comentário do diretor sobre cenas picantes, sua extensa duração (cinco horas dividida em dois capítulos) ou pôster provocador era como um petisco do que estava por vir. Lançado nos cinemas os curiosos foram assistir, mas entre eles quem era fã de Lars tinha altas expectativas, afinal de conta o sexo já foi elemento de algumas obras anteriores do diretor, seja no sofrido Ondas do Destino (1996), no brilhante Dogville (2003) e, principalmente, no horror Anticristo (2009). Era esperado que o diretor subvertesse o que o público esperava e criasse outra obra surpreendente. No entanto, devo registrar que me decepcionei bastante com o filme (o que não deixa de ser surpreendente, já que curto o trabalho do cineasta). Trier sempre foi uma bom diretor de atores e um roteirista de mão cheia, mas aqui ele não faz a mínima ideia do que fazer com sua história. Apesar de ser um dos seus filmes mais bem cuidados (existem vários detalhes que tendem a tornar o resultado mais pop, como a trilha sonora e a fotografia belíssima), mas a história de Joe é simplesmente tediosa. Nesse volume 1, conhecemos a infância e a adolescência da personagem, conhecemos a influência de sua amiga B no desenvolvimento de sua sexualidade, a distância afetiva de sua mãe (uma silenciosa Connie Nielsen), a admiração que tem pelo pai (Christian Slater) e o nascimento de sua paixão por Jerome (Shia Labeouf), seu primeiro homem - o qual encontrará diversas vezes na narrativa. O filme é isso. É verdade que para tornar tudo mais "dinâmico", o diretor opta por colocar Joe mais velha (vivida por Charlotte Gainsbourg, atriz que tornou-se a favorita do diretor) contando suas desventuras a um desconhecido (Stellan Skarsgard, o ator favorito de Lars). Ela não entra em detalhes sobre seus parceiros, afinal, eles estão ali apenas para cenas de sexo sem muita importância - afinal, diante da tediosa vida de Joe a única graça que existe no mundo é transar. Existem momentos cômicos, como aqueles em que ela se confunde com as ligações de seus vários parceiros ou quando faz considerações sobre o comportamento deles. Existem outros agradavelmente estranhos (como a visita de Uma Thurman à casa da amante do esposo), outros comoventes (os últimos dias do pai de Joe) e até românticos (como o segundo reencontro de Joe com Jerome), mas Lars tem uma dificuldade gigantesca de criar sua personagem. Vivida quando jovem pela novata Stacy Martin, Joe está longe de ser uma personagem interessante, parece apenas entediada em meio aos bons coadjuvantes em cena. Talvez essa seja a intenção de Lars, criar uma personagem oca que evite que caia em moralismos ou simples pornografia, mas percebe-se uma tendência de criar uma aura erudita à trama, o que é duro de engolir. O roteiro tenta fazer analogias do comportamento de Joe com o ato de pescar, com Fibonacci, com a música e outras coisas numa fragilidade que mostra-se um tanto patética. Tropeçando em sua própria pretensão, tudo que a história poderia ter de dramática, cômica e até eroticamente interessante fica pela metade do caminho, parecendo uma versão piorada de Romance (1999) de Catherine Breilat e menos interessante que 9 Canções (2004) de Michael Winterbotton, ambos polêmicos, explícitos e irregulares, mas que chegavam mais perto de suas ambições do que a frágil obra de Trier. Parece que o filme tenta ser a versão feminina do bem sucedido Shame (2011), mas não funciona. O último ato até promete que as coisas podem melhorar no segundo volume, mas ainda acho que as ideias de Ninfomaníaca - volume 1 caberiam em um curta de vinte minutos.
Ninfomaníaca - Volume 1 (Nynphomaniac: Vol.I/Dinamarca, Alemanha, Bélgica, França, Reino Unido - 2013) de Lars Von Trier com Charlotte Gainsbourg, Satacy Martin, Shia Labeouf, Stellan Skarsgaard e Uma Thurman. ☻
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