domingo, 30 de maio de 2021

PL►Y: Relíquia Macabra

Avó, mãe e filha: o corpo é uma relíquia. 

Nos últimos anos um grupo de diretores estão procurando fazer filmes de terror na contramão do saturado mercado de serial-killers, monstrengos assassinos e lunáticos que vigoraram no gênero por tanto tempo. Em forma de narrativas mais contidas e atuações intimistas, o gênero passa por uma espécie de renovação que lhe cai muito bem e tem como expoentes Robert Eggers (A Bruxa/2015 e O Farol/2019) e Ari Aster (Hereditário/2018 e Midsommar/2019). Em 2020 duas diretoras entraram para o grupo, uma foi a inglesa Rose Glass (Saint Maud) e a outra foi a australiana Natalie Erika James deste Relic, que no Brasil ganhou o nome de Relíquia Macabra. Acho que o título brasileiro não cai muito bem às ideias do filme, já que de fato existe uma relíquia no filme (um vitral ligado a um  trauma presente na história), no entanto, o horror do filme se relaciona muito mais às relações das três mulheres e o medo do abandono, do envelhecimento e da morte  (algo que conforme a última cena deixa claro, deve se perpetuar no trio). Quem está acostumado à esta renovação do gênero já sabe que o horror é mais psicológico e se desenvolve aos poucos, especialmente pelo constante flerte com a loucura de forma que o espectador não sabe ao certo o que está acontecendo até o desfecho. Aqui, mãe (Emily Mortimer) e filha (Bella Heathcote) vão para a casa da avó (Robyn Nevin), que está desaparecida e ninguém sabe ao certo o que aconteceu com ela. A casa está visivelmente deteriorada, com madeiras envelhecidas, podres e bolores subindo pelas paredes e, para completar, até os poucos vizinhos percebem que aquela senhora andou com um comportamento estranho nos últimos tempos. A casa é arrepiante por si só, com seu potencial para ser mal assombrada em seu processo de deterioração e barulhos soturnos. Eis que a vovó aparece e o que poderia ser interpretado como traços de senilidade começa a se tornar algo muito mais complicado, especialmente pelo estranho hematoma que ela exibe no peito. Uma mancha escura que se assemelha a mesma que pode ser vista em diversas partes da casa. A coisa fica mais estranha quando a vovó é acolhedora em um instante e no outro é capaz de ser agressiva e impaciente, aguçando no espectador a curiosidade e uma certa perplexidade. Nos minutos finais o filme deixa a sugestão de lado e parte para o tipo de terror mais comum com ataques, sangues e monstros estranhos e deixa na cabeça do espectador uma interrogação ainda maior, no entanto, o que a diretora parece dizer é que não adianta tentar fugir: o futuro é inevitável. Relíquia Macabra deixa a impressão que demora muito para engrenar, mas na verdade se constrói nos laços entre as três personagens, evidenciando posturas que se reproduzem e elas parecem não perceber. Reside aqui uma estranheza que lhe rendeu comparações com Hereditário, mas não chega a ousar tanto. Visivelmente com orçamento mais modesto e menos radicalismo, Relic se comporta como um exercício interessante de suspense até que toda sua estranheza se revela. Ainda que soe pouco empolgante para a maioria dos espectadores, a diretora Natalie Erika James demonstra ser bastante promissora no gênero. Tendo aqui a sua carta de apresentação é o tipo de cineasta em que vale a pena ficar de olho nos projetos futuros. 

Relíquia Macabra (Relic / Austrália - EUA / 2020) de Natalie Erika James com Emily Mortimer, Robyn Nevin, Bella Heatchcote, Chris Bonton e Steve Rodgers. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário