domingo, 24 de abril de 2016

Na Tela: A Bruxa

Anna Taylor-Joy: o terível medo do desconhecido. 

Sempre costumo dizer que sou fã dos filmes de terror clássicos, aqueles cheios de clima e atmosfera, que faz nossa cabeça delirar com o poder da sugestão de um bom diretor. Lançado recentemente A Bruxa foi celebrado por resgatar alguns elementos dos filmes de horror que andavam esquecidos, esqueça os sustos fáceis, as explosões de som e a sanguinolência gratuita, o diretor Robert Eggers quer muito mais do expectador. Premiado em Sundance pela direção do longa em 2015, Eggers faz realmente um trabalho notável, não apenas na condução de seu elenco (que precisa dar conta de diálogos em inglês arcaico) mas na concepção visual e narrativa do filme. O filme acompanha uma família que no ano de 1630 que carrega o fardo de ser expulsa de sua comunidade cristã. Não fica muito claro o motivo do banimento, o fato é que William (Ralph Ineson) e Katherine (Kate Dickie) partem para viver perto de uma floresta, bem longe da civilização, junto aos quatro filhos: Thomasin (Anna Taylor-Joy), Caleb (Harvey Scrimshaw), os gêmeos Mercy (Ellie Grainger) e Jonas (Lucas Dawson), além do bebê Samuel. Embora a religião é latente para que a família suporte a intensa rotina de trabalho, tudo fica pior quando Thomasin brinca com Samuel perto da floresta e, subitamente, o bebê desaparece. A família logo acredita que algum animal possa tê-lo levado, mas a desconfiança de que existe algo de muito estranho por ali já está plantada. Some o desaparecimento às desconfianças que começam a cair sobre Thomasin - e as brincadeiras das crianças com um bode preto (preste atenção nas letras das músicas) - e você terá ideia do que acontecerá no filme. A narrativa lenta e os cortes que sempre parecem esconder algo do espectador servem para que o diretor aumente gradualmente a tensão da plateia, temperando com fé, vergonha, culpa, medo e desespero as relações daquela família. A bela fotografia cinzenta e a trilha sonora de vozes dissonantes (que parecem vir de alguma fenda do inferno) auxiliam a construção do pesadelo em que mergulham os personagens agarrados à fé, ao mesmo tempo que acreditam ter o pecado correndo em suas veias (e, portanto, não são dignos de salvação). O roteiro do próprio Eggers investe em várias camadas que podem ser exploradas pelo expectador, o estigma do banimento, a latência da puberdade, as brincadeiras e fantasias que ganham formas assustadoras diante do horror que devora as entranhas. Das roupas que parecem um fardo por si só, passando pelas maçãs que nunca são encontradas (que remete aos contos de fadas, assim como o pecado bíblico), o filme é repleto de detalhes que o valoriza e enriquece. Por seu horror psicológico (que nasce na tela e amplia-se na mente do espectador), A Bruxa merece destaque nos filmes do gênero no século XXI. Entre todas as suas qualidades, merece destaque a bela criação que a jovem atriz Anna Taylor-Joy faz de Thomasin (que perde a inocência lentamente perante a histeria de sua mãe e a tentação que aos poucos se aproxima), porém, o verdadeiro horror de A Bruxa não está no que vemos na tela, reside justamento no oposto: no desconhecido. Ao valorizar o que não é mostrado, o filme se torna mais assustador por deixar que o espectador preencha as lacunas com seus próprios temores - e não há nada mais arrepiante do que isso.  

A Bruxa (The Witch/EUA-2015) de Robert Eggers com Anna Taylor-Joy, Ralph Ineson, Kate Dickie e Harvey Scrimshaw. ☻☻☻☻

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