quarta-feira, 6 de setembro de 2023

CICLO VERDE E AMARELO: Marte Um

 
Os Martins: hora de olhar para cima. 

A família Martins é uma família comum da periferia de Contagem em Minas Gerais. O pai, Wellington (Carlos Francisco) trabalha em um prédio de classe alta, a mãe, Tércia (Rejane Faria) trabalha como diarista, a filha, Eunice (Camilla Damião) está começando a namorar Joana (Ana Hilário) e planejam morar juntas, a família se completa com o caçula Deivinho (Cícero Lucas), que precisa lidar com as expectativas do pai com sua carreira no futebol enquanto deseja ser astrofísico. O sonho do menino é participar da missão que dá nome ao filme e que planeja colonizar Marte. Estes são os protagonistas do novo filme de Gabriel Martins (de No Coração do Mundo/2019), que se tornou um dos mais elogiados dos últimos anos, premiado com oito estatuetas no último Grande Prêmio Cinema Brasil (filme, direção, ator, ator coadjuvante, fotografia, montagem, roteiro original e melhor som) e que ganhou fama ao ser o longa candidato do Brasil a disputar uma vaga ao Oscar de filme estrangeiro de 2023 (e acabou ficando de fora). Eu gostaria muito de dizer que a esnobada foi injusta, mas assistindo ao filme, dificilmente ele teria conquistado meu voto para ficar entre os cinco finalistas. Produzido pela produtora mineira Filmes de Plástico, o filme tem a proposta de ser um retrato do cotidiano de personagens comuns, mas ao contrário dos outros filmes da produtora, este me deu a impressão de ser uma grande colagem de lugares comuns quando se retrata personagens periféricos no cinema. Obviamente que existe o mérito de ser um filme protagonizado por uma família preta, algo ainda raro no cinema brasileiro, mas alguns personagens não possuem muito para fazer em cena. O patriarca parece ter o que fazer somente na parte final quando o inferno astral se abate sobre ele, a filha vivida por Camilla Damião é ausente de qualquer energia (basta ver sua apatia na cena pós-acidente que não vou contar para evitar SPOILERS), a própria trama de Deivinho também não me parece aproveitada em todas as suas possibilidades. Única personagem com um arco bem desenvolvido é a mãe (vivida pela ótima Rejane Faria) que fica traumatizada ao participar de uma "pegadinha" televisiva e a partir dali acredita atrair coisas ruins para quem estiver por perto. Além de ter a trama mais interessante, a personagem é a única feita de carne e osso numa produção ensaiada demais para soar realista. Filmes sobre o cotidiano são complicados e necessitam de habilidade para driblar a sensação de que nada acontece em cena. Em Marte Um muitos fatos acontecem com seus personagens, mas nada soa interessante, apenas esquemático para chegar ao desfecho em que uma explosão é resolvida ao contemplar o céu no fundo do quintal. Aqui parece ser onde o filme começa e não onde termina. Acho que toda a expectativa gerada em torno do filme prejudicou meu olhar sobre ele, mas dificilmente eu acharia que os dilemas apresentados são desenvolvidos a contento. Além do trabalho de Rejane salva-se a fotografia que consegue bons momentos dentro da proposta não concretizada do filme, ops, talvez a proposta seja a aclamação de uma elite que sente-se bem em aplaudir um filme que é uma colagem do que ela imagina sobre uma família periférica cheia de sonhos.

Marte Um (Brasil/2022) de Gabriel Martins com Cícero Lucas, Carlos Francisco, Rejane Faria, Camilla Damião, Russo APR e Thiago Cesário.  

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