sexta-feira, 8 de setembro de 2023

PL►Y: Men - Faces do Medo

 
Rory: a nova esquisitice de Alex Garland. 

Harper (Jessie Buckley) acaba de ter seu casamento desfeito de forma traumática. Em flashbacks vemos que seu relacionamento com James (Pappa Essiedu) era bastante complicado, marcado por abusos e obsessões. Parece que a personagem já queria sair daquele relacionamento faz tempo, mas a forma como aconteceu lhe deixou marcas profundas. Afim de espairecer, ela se muda para uma casa no campo que inspira tranquilidade, embora o proprietário Geoffrey (Rory Kinnear) seja um mestre em fazer piadas sem graça. Enfim, Harper não planeja morar com ele mesmo... mas o que ela imaginava ser uma temporada de sossego, logo irá se tornar um pesadelo. Se um homem nu passa a rondar a casa, a deixando assustada, aos poucos ela começa a conhecer os outros homens das redondezas. Um padre, um policial, um adolescente problemático, o dono do pub... todos parecem um tanto desagradáveis e deixam aquele aparente paraíso (com direito à uma bela macieira da qual Harper experimenta o fruto logo no início da sessão) com a maior pinta de um episódio de Além da Imaginação. Colabora mais ainda para essa sensação o fato de todos os personagens masculinos contarem com a cara (e a versatilidade) de Rory Kinnear que se desdobra em caracterizações diferenciadas de todos que cruzam o caminho da personagem. Men é o terceiro longa-metragem de Alex Garland, que começou a carreira como elogiado escritor (foi ele o autor do ótimo A Praia que depois virou um filme meia-boca de Danny Boyle com Leonardo DiCaprio) demonstrou em sua transição para o cinema dominar muito bem a capacidade de construir uma estética própria para cada filme (basta ver a esterilididade de Ex-Machina/2015 ou a beleza grotesca de Aniquilação/2018), aqui ele capricha no uso de cores (sobretudo o verde) para simular um paraíso contaminado e se torna ainda mais inventivo no final em que um personagem passa a parir outros sucessivamente. Diante da complexidade da personagem de Jessie Buckley e o emaranhado de Kinnears que aparecem em cada cena, eu parei de querer encaixar as peças e passei apenas a apreciar o que Garland me apresentava. Após a sessão nem tudo ficou claro. O longa parece falar da saúde mental de quem sobrevive a um relacionamento abusivo e seu confronto com a masculinidade tóxica presente numa sociedade patriarcal. Não é por acaso que Garland escolheu o mesmo ator para viver todos os personagens daquela cidade, mas seria um tanto redutivo dizer que todos os homens são iguais, já que o final reserva uma surpresa. Também é interessante que no confronto final, Harper esteja usando um vestido rosa que evoca uma "donzela desprotegida" para logo depois subverter essa impressão equivocada. Cheio de ideias, Men parece não saber muito bem para onde ir, mas pelo menos consegue utilizar o terror para criar fantasias sinistras interessantes que podem ser analisadas às luz de discussões pertinentes. No entanto, vale destacar, que o filme funciona mesmo é pelos trabalhos excepcionais  de Jessie e Rory numa dinâmica assustadora. Exibido na Quinzena de Realizadores no Festival de Cannes do ano passado o filme dividiu opiniões.

Men - Faces do Medo (Men / Reino Unido - 2022) de Alex Garland com Jessie Buckley, Rory Kinnear, Paapa Essiedu, Gayle Rankin e Sarah Twomey. 

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