Sabe aquele filme premiado que fica na sua lista da Netflix e fica lá, esquecido... até que um dia você assiste e se arrepende de não ter assistido antes? O Cidadão Ilustre foi um destes. O filme é bastante interessante em seu olhar ácido sobre o culto às celebridades e, desde o início, deixa claro que o tal cidadão do título não é a criatura fofinha que muitos imaginam. Afinal, seu discurso ao receber o Prêmio Nobel de Literatura é praticamente uma total desconsideração ao mérito que o prêmio possa ter, já que Daniel Montavani (Oscar Martínez em uma atuação deliciosa que lhe valeu o prêmio de melhor ator no Festival de Veneza) deixa bem claro o quanto ser reconhecido é ter se tornado convencional e pouco criativo. Um tanto irritado com o culto que se formou em volta de sua carreira literária, ele tem cada vez menos paciência para entrevistas e eventos, mas no meio de todos os convites que recebe está o de visitar sua pequena cidade natal na Argentina, a mesma cidade que serviu de inspiração para algumas de suas obras reconhecidas internacionalmente. Se no início o convite é visto com estranhamento, aos poucos ele considera que seria uma boa ideia rever o local que lhe serviu de inspiração (lugar que estava apenas na memória por tanto tempo). No entanto, assim que chega, percebe que as condições serão bem diferentes dos grandes eventos a que se acostumou a participar, mas pelo menos pode rever amigos, um amor do passado e ver que a cidade tem muito orgulho de seu trabalho - pelo menos até que uma sucessão de acontecimentos comecem a colocar a admiração lado a lado com uma certa antipatia que termina quase em linchamento. Da forma como se posiciona artisticamente até a forma como retrata a cidade passa a ser revista pelos moradores e os conflitos são inevitáveis, fãs ficam decepcionados com o escritor e uma fã mais atirada acaba rendendo mais problemas do que ele imagina. O roteiro de Andrés Duprat faz humor das situações mais simples e revela muito sobre o escritor, que decepciona seus fãs ao mostrar-se uma pessoas de carne e osso, com qualidades e defeitos, além de não muita paciência para o culto em torno de sua pessoa (embora também ele se revele mais vaidoso do que ele mesmo imagina). Os diretores Gastón Duprat e Mariano Cohn conta esta história sem firulas, com enquadramentos simples e tom quase documental que rende surpresas ao se distanciar sempre das expectativas do espectador. A narrativa cresce comicamente na construção de uma espécie de bomba-relógio até aquela cena final cheia de tensão. Sem poupar comentários sobre a importância da arte e do artista, assim como esta relação tende ficar embaçada nos tempos de hoje, o filme resulta divertido, provocativo e bastante astuto em seu olhar sobre o culto às celebridades.
O Cidadão Ilustre (El ciudadano ilustre / Argentina - 2016) de Gastón Duprat e Mariano Cohn com Oscar Martínez, Dady Brieva, Andrea Frigerio, Nora Navas, Marcelo D'Andrea, Emma Rivera, Nicolás de Tracy. ☻☻☻☻
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