Hall: uma cética exorcizando seus próprios fantasmas.
Admiro os diretores que ainda brigam para fazer filmes de terror elegantes, sem aquele monte de sangue jorrando, vísceras aparecendo e torturas físicas elaboradas que andam na moda. Pena que isso não garante que o filme tenha um final satisfatório. Um exemplo disso é O Despertar, filme britânico estrelado por uma das atrizes mais interessantes da Hollywood atual, a ainda subestimada Rebecca Hall. O Despertar tem atuações competentes, aquela atmosfera que relembra os grandes clássicos do horror e aquele toque especial que consegue fazer a diferença do gênero: ter um protagonista que potencializa as assombrações com seus próprios fantasmas. O problema é que ao chegar no final o roteiro prefere perder a elegância e inventar um final "surpreendente", nem precisava, eu ficaria satisfeito com um final limpo e menos mirabolante para a história de Florence Cathcart (Hall) uma caçadora de fantasmas do ano de 1921, ou melhor, uma caçadora de "não fantasmas", já que ganha a vida destruindo golpes que utilizam a crença espíritos. O fato dela ser o terror dos médiuns fajutos é mostrado logo no início, com proposital falta de sutileza. Mesmo assim, a moça é capaz de se surpreender com uma mãe que a agride por desmascarar os golpistas que a enganavam golpistas ("Você nunca teve um filho?" pergunta a enganada). Parece uma cena simples, mas ela evidencia os dilemas que a cética Florence Cathcart (esse sobrenome é risível) enfrenta. Ela não acredita em fantasmas e não consegue lidar com a estranha morte dos pais quando ainda era pequena, além de um pretendente que morreu na guerra. É como se Florence se ressentisse por uma redentor último momento que nunca irá acontecer. Florence é tão famosa na região que o diretor de um internato, dedicado quase que exclusivamente a órfãos, a chama para desvendar um mistério acerca do fantasma de um menino que vem assombrando os alunos - e a situação piorou bastante depois que um menino foi encontrado morto. Cética, ela tem explicações e parafernálias para refutar qualquer explicação que denote algo sobrenatural. Pois em sua temporada no tal internato, a protagonista irá rever alguns de seus conceitos. O filme investe em uma galeria de personagens de grande potencial, um diretor (Dominic West) que carrega suas próprias cicatrizes da guerra, uma funcionária que faz as vezes de "matriarca" da instituição (Imelda Stauton), alguns professores conhecidos por sua rigidez e um zelador esquisito. Todos eles mostram-se peças eficientes na trama onde os meninos assustados dividem o tempo entre aulas, travessuras e algumas crueldades com os colegas mais quietinhos. Quando a trama encontra a solução para a morte do menino, as coisas ficam mais esquisitas já que as argumentações e apetrechos de Florence não dão conta do que está por vir. Hall dá conta de sua personagem com charme e inteligência, até quando a trama cai no desfecho mais usado desde que M. Night Shyamalan lançou seu Sexto Sentido/1999. Se o filme perde a chance de surpreender optando por uma guinada sentimentalista, pelo menos, ele consegue segurar o fôlego da plateia por mais de hora e meia com sua atmosfera de truques simples e elegantes. O diretor Nick Murphy acerta na parte técnica, nas atuações, na atmosfera triste, mas, infelizmente, quase estraga tudo na reta final. Ainda assim, quem gosta de um filme de terror sem histeria pode apreciar o filme.
O Despertar (The Awakening/Reino Unido-2011) de Nick Murphy com Rebecca Hall, Dominic West, Imelda Staunton e Isaac Hempstead Wright. ☻☻
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