Michelle/Monroe: um ícone por trás das câmeras.
Penso no frio que dá na barriga de um ator quando é escolhido para viver um ícone do cinema na telona. Esta sensação desconfortável deve ter passado por algum minuto pelo corpo de Michelle Williams quando foi escolhida para trazer de volta à tela a persona de Marilyn Monroe. Sei que soa preconceituoso, mas eu não acreditei que a atriz fosse capaz de viver o maior símbolo sexual de Hollywood. Desde os tempos em que era a lourinha enjoada do seriado Dawson's Creek, Michelle nunca buscou personagens que primassem pelo sex appeal. Está certo que aos poucos a moça foi se mostrando uma atriz cada vez mais competente em papéis que exigissem força e fragilidade (somando duas merecidas indicações ao Oscar, uma de coadjuvante por Brokeback Mountain/2005 e outra de atriz principal por Namorados para Sempre/2010). Pois não é que Michelle deu conta de viver Marilyn no cinema - sendo indicada a todos os prêmios da temporada, incluindo o Oscar e levando o Globo de Ouro de Comédia/Musical para a casa. A atriz tem momentos luminosos como a estrela, sendo esperta o suficiente para captar que a Marilyn que nós conhecemos era, também, uma personagem criada por Norma Jean Martenson. Se Marilyn era a persona artística de pura sensualidade, sorriso maroto e olhos calorosos, na intimidade ela era Norma Jean, uma mulher insegura que carregava nos ombros o peso de ser a maior estrela do cinema de seu tempo. O filme promete trabalhar essa ambiguidade da loura mais cobiçada de Hollywood durante a filmagem de O Príncipe e a Showgirl (1957) dirigido por Laurence Olivier. A produção foi marcada por grandes desentendimentos entre seus dois astros, já que Olivier (vivido no filme por Kenneth Branagh, indicado ao Oscar de coadjuvente) além de dirigir também atuava - no que segundo ele era uma comédia leve. A alegria com que consegue convencer Monroe a participar da produção britânica logo é substituída pela angústia de atrasos constantes e inseguranças na hora de filmar. Se Marilyn é a estrela, Olivier é a verdadeira diva da história. Temperamental ele intimida Marilyn desde o início e o resultado é desastroso para a ela. Apesar dos cinéfilos estarem interessados na relação de dois ícones do cinema (tendo ainda uma ciumenta Vivien Leigh vivida por Julia Ormond), a trama tem como verdadeiro personagem principal o terceiro assistente de direção de Sir Laurence Olivier, Colin Clark (Eddie Redmayne, mais convincente do que em seus outros filmes) é ele que se apaixona pela estrela e descobre a mulher que está por trás do mito. Obviamente que existem alguns obstáculos em seu caminho, já que Monroe vivia o seu terceiro casamento, desta vez com o dramaturgo Arthur Miller (Dougray Scott) e estava sempre aos cuidados do agente (Dominic Cooper) e sua professora de teatro Paula (Zoe Wanamaker). O maior problema do filme é que ele demora a engrenar, até que Michelle apareça o filme se alonga em mostrar o interesse de Colin em trabalhar no cinema. Depois, o filme se enrola um bocado com o conflito da atriz em "encontrar" a personagem (enquanto todo mundo só esperava que fosse tão sexy como em todos os outros papéis que teve). Custa um pouco para que a plateia entenda o que Colin explica: ela é "uma estrela de cinema querendo se tornar uma grande atriz e Olivier é um grande ator querendo se tornar um astro de cinema - e esse filme não ajudará nenhum dos dois". O diretor Simon Curtis também poderia ter usado menos aquela trilha sonora que faz o longa parecer um filme da Disney e concentrado mais em sua diva, já que Williams consegue captar a essência da personagem de forma surpreendente. Se os contornos voluptuosos se devem ao uso de enchimentos e dublê de corpo sempre que a personagem aparece como veio ao mundo, o olhar, o sorriso e os trejeitos se devem à dedicação de Michelle em aceitar o maior desafio de sua carreira. A cena musical no início que repete "Eu consigo" em vários versos, parece um recado prévio de que ela é capaz de assumir essa tarefa perigosa sem prejudicar a carreira. Se a performance da moça tem momentos mágicos (a cena em que canta na banheira é, de longe, a mais bela do filme), o roteiro poderia ter dedicado mais espaço para entendermos as crises da estrela, seu relacionamento com as pílulas enquanto tinha aquele magnetismo irresistível. Da forma como aparece no texto, tudo fica subentendido demais. Entendo que o fato do filme ser baseado no olhar de uma terceira pessoa sobre ela cause esse efeito (Colin Clark realmente existiu e escreveu seu livro de memórias sobre o tempo em que ficou próximo da estrela), mas o filme poderia ter se tornado mais rico ao explorar ainda mais as nuances tão diferentes de Marilyn. Ainda que conte com o auxílio luxuoso de Judy Dench, Emma Watson e Toby Jones no elenco, no fim das contas fica a imagem de Michelle mais uma vez vulnerável em cena (mas com os momentos mais sexys de sua carreira em delicioso contraponto).
Sete Dias com Marilyn (My Week with Marilyn/EUA-Reino Unido/2011) de Simon Curtis com Michelle Williams, Eddie Redmayne, Kenneth Branagh, Julia Ormond, Judy Dench, Emma Watson e Dominic Cooper. ☻☻☻
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