Gibson, o castor e Jodie: injustiçada dramédia além da imaginação.
Existem filmes que devemos ver depois que todo tipo de coisa já foi dita sobre ele. Depois de ouvir comentários positivos e negativos, aguarde quase um ano para assistí-lo e você poderá ter uma grata surpresa. Essa foi a estratégia que adotei com o terceiro filme dirigido por Jodie Foster, lançado por aqui com o nome de Um Novo Despertar. Eu fiquei interessado pelo filme assim que soube que se tratava da história de um homem que passa a se relacionar com o mundo usando o fantoche de pelúcia. Devo admitir que minha mãe tem razão quando diz que eu adoro filmes esquisitos, mas o filme não me parecia realmente estranho. Tinha o Mel Gibson no papel do tal cara, Jodie Foster como a esposa (que tenta ser) compreensiva, Anton Yelchin como o filho cheio de restrições em sua relação com o pai e Jennifer Lawrence como paquera do moço. Ou seja, só o elenco já merecia atenção. Filme lançado, eu fiquei satisfeito com a presença de Mel Gibson no trailer, pensei até que poderia aparecer em algumas premiações pelo papel, mas conforme as críticas negativas foram pilhando o filme perdeu força e não fez sucesso. Sinceramente eu não entendi o motivo de tantas críticas. Foster tem um olhar aguçado sobre as relações familiares, mais do que isso, tem seu foco voltado para pessoas que tem dificuldades em lidar com os outros - mesmo com os mais próximos. Foi assim com o ótimo Mentes que Brilham (1991), prosseguiu no fraco Feriados em Família (1995) e em Um novo Despertar a ideia parece chegar ao ápice. O problema todo parece ser que o estúdio quis vender o filme como uma comédia maluca, mas o filme está longe de ser isso. Obviamente que existe um apelo cômico num adulto que vive com a mão enfiada num fantoche o tempo inteiro, mas o olhar de Foster e de Gibson caminha para outra direção: a proposta do espectador entender o que leva esse homem a utilizar esse mecanismo para sobreviver socialmente. É neste ponto que o filme esbarrou em outro detalhe que não é novidade para ninguém: a vida de Mel Gibson. Gibson foi um dos astros mais queridos de Hollywood nas últimas décadas, mas depois de vários escândalos em sua vida particular as coisas se complicaram e afetaram drasticamente o filme. Vale lembrar que Jodie Foster é sua amiga há tempos e o filme poderia ser visto como a tentativa de mostrar que Gibson continua sendo um ator confiável, mais do que isso, aqui ele entrega (em minha modesta opinião), a melhor atuação de sua carreira. Não lembro de ter visto o ator mergulhar com tanto gosto nas camadas um personagem e, nesse quesito, Walter Black é um prato cheio. Black já foi um executivo bem sucedido da produção de brinquedos, mas amarga um período de depressão. Sua vida familiar e carreira fica em frangalhos, até que começa a utilizar o fantoche de castor como alter ego numa espécie de terapia. No começo a ideia é vista de forma engraçadinha, mas até tudo começa a progredir novamente, mas conforme o roteiro segue percebemos que a situação de Walter é mais complicada do que imaginamos. O angustiado Walter passa a ser uma espécie de prisioneiro do fantoche, que quebra sua personalidade onde a parte "humana" não tem vontade de reagir à força do alter-ego. Precisa dizer os efeitos disso sobre a relação com a esposa e os filhos? Nesta tarefa Jodie Foster apresenta uma visão cênica bastante interessante para o texto de Kyle Killen (que era elogiado nas gavetas dos estúdios, mas que ninguém tinha coragem de filmar, até cair nas mãos dela), através de suas lentes podemos perceber cada passo que Walter em direção ao seu abismo pessoal. Embora não seja perfeito (acho que a subtrama romântica entre Yelchin e Jennifer está sobrando), o filme consegue ser bastante interessante, especialmente quando se torna cada vez mais sombrio na situação absurda do protagonista. Vendo o filme com o distanciamento temporal que eu desejava, posso até compreender que as semelhanças de Walter com a crise de Gibson pode ter prejudicado a repercussão do filme, mas acho que o longa não teve o sucesso que merecia porque explora mais feridas do que o público costuma querer observar.
Um Novo Despertar (The Beaver/EUA-2011) de Jodie Foster com Mel Gibson, Jodie Foster, Anton Yelchin e Jennifer Lawrence. ☻☻☻☻
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