Darín: bom em empalhar, péssimo para caçar.
Aura é o tipo de filme que costumo dizer ter como protagonista um sujeito invisível, quase um fantasma. Assim como em O Profeta (2009), o personagem principal passa desapercebido pelas situações mais improváveis menos por sua vontade e mais pela forma como o mundo lida com ele. Quando vemos o taxidermista Esteban (o famoso Ricardo Darín) especulando sobre o assalto perfeito na fila de um banco, temos uma pequena amostra do que a mente daquele sujeito pacato é capaz. Ainda assim, ironicamente, ele sofre de epilepsia e, como todos que sofrem da doença, vive momentos de plena inconsciência. Eis que Esteban é convidado para uma temporada de caça junto a um amigo. Ele ruma para um bosque e fica hospedado em uma hospedaria modesta em meio às árvores e nunca conhece o proprietário. Mas, para sua frustração, mesmo depois de anos empalhando animais, Esteban não consegue atirar neles. Mesmo assim, Esteban irá cometer um acidente que não só irá comprometer sua temporada naquele lugar, como também irá envolvê-lo na orquestração de um crime. O diretor/roteirista argentino Fabián Belinsky não tem pressa de apresentar a trama para o espectador, montando-a aos poucos, revelando os acontecimentos para a plateia ao mesmo tempo que o taxidermista os conhece. Os fatos o farão descobrir que o dono do local em que está hospedado possui alguns segredos que esconde da própria esposa (Dolores Fonzi), mas que são conhecidos pelo jovem cunhado. Conforme o roteiro apresenta os passos para um grande assalto na região, Belinsky investe num clima noir envolvente, onde a relação sutil de Esteban com a esposa do proprietário, contrasta com a violência crescente que irá culminar em um momento de grande tensão. Mais interessante é a forma como o texto apresenta a astúcia do personagem em costurar as informações que chegam até ele. Devido à engenhosidade da história, o filme depende de uma espécie de cumplicidade entre a plateia e o protagonista (e isso consegue construir muito bem) até o momento em que o plano é posto em ação - mas o fracasso parece anunciado desde o primeiro ato. O mais curioso é como, aos poucos, o filme foi construído de forma que Esteban saia daquelas situações com a mesma desenvoltura com que entrou. Apesar de nada sair conforme o esperado, sua vida (como de todo bom fantasma) continua (quase) a mesma coisa. Bem construído e cheio de suspense, o filme tem tudo para agradar os fãs do gênero.
Aura (El Aura/França-Argentina/2005) de Fabián Belinsky com Ricardo Darín, Dolores Fonzi, Pablo Cedrón e Walter Reyno. ☻☻☻
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