Marina e seu agressor: amor, estranho amor...
Não é sempre que nos deparamos com um filme russo, mesmo assim quando vemos o filme da diretora Angelina Nikovana temos certeza que é o tipo de obra feita para criar polêmica por onde passa, gerar debates e uma relação de amor e ódio com o espectador. O que esperar de um filme onde a protagonista se apaixona pelo estuprador - e se sujeita a ser agredida sempre que ela declara seu amor por ele? Parece coisa de troglodita? E se eu disser que o roteiro foi escrito pela diretora e atriz principal? Não é fácil descrever as emoções que o filme desperta desde o seu início quando um trio de policiais estupram uma garota de programa que acaba de fazer o serviço para um caminhoneiro. Sabemos que ela não é a primeira e nem será a última vítima do trio e quando a narrativa corta para o rosto insatisfeito de Marina (Olga Dihovichnaya), sabemos como o caminho dos personagens irá se cruzar. Por uma sucessão de erros e escolhas que podem ser atribuídas ao orgulho da personagem ela será violentada e terá a parte obscura de sua personalidade revelada a quem está ao seu redor. Tudo indica que Marina é casada com um homem carinhoso, possui um bom emprego, roupas caras, tem um emprego respeitado (é assistente social), é inteligente, mas toda essa bolha de perfeição esconde uma espécie de vácuo existencial. Diante do fracasso das instituições que poderiam ajudá-la a fazer justiça (a cena em que conversa com uma policial sobre a violência que sofreu é devastadora pela indiferença com que lidam com a situação). Marina não zela nem pela festa de aniversário surpresa que lhe preparam, não pensando duas vezes em contar os segredos que aqueles rostos sorridentes escondem dos amigos. A bolha perdeu todo o sentido? Provavelmente. Por isso, quando Marina segue um dos seus agressores com uma garrafa quebrada em punho pensamos que estamos diante de uma história trivial de vingança. Pode até ser, mas por uma perspectiva diferente. Depois do tórrido encontro em um elevador, ela e o agressor (Sergei Borisov, que talvez seja o homem mais indiferente de todo o filme) se encontram mais algumas vezes. Ela mente para o marido e passa a viver alguns dias com o amante, demonstrando uma passividade e submissão difíceis de digerir. Porém, ela sempre diz que o ama. Um romance que parece guiar para uma redenção cada vez mais distante. É difícil entender como a personagem parece estar mais confortável naquele ambiente deplorável e sujo do que no ambiente que estava no início do filme. Penso no que as feministas diriam sobre o filme. Lembro das fãs de 50 tons de Cinza toda vez que Marina é agredida e admiro a coragem de uma diretora fazer um filme que flerta tanto com a misoginia. Talvez, o sucesso do filme em festivais europeus, seja pela cena final, onde até um homem com dificuldades de se relacionar com o amor parece seguí-lo para mais algumas doses.
Twilight Portrait (Rússia-2011) de Angelina Nikovana com Olga Dihovichnaya, Sergei Borisov e Sergei Golyudov. ☻☻
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