Em 2010 o cineasta iraniano Jafar Panahi foi condenado à prisão por seis anos (depois convertida em prisão domiciliar) e a não fazer filmes por vinte anos (e cada filme que realizar somará mais seis anos em sua sentença). Seu crime? Realizar filmes que fazem propaganda negativa de seus país. Se levarmos em conta que Panahi ganhou fama mundial por fazer justamente o que recomendam que ele não faça, seria difícil imaginar que ele obedecesse. Desde que foi condenado, o diretor já realizou outros seis filmes com a ajuda de câmera digitais portáteis. Proibido de sair do país, suas obras são enviadas para distribuidores internacionais e premiados em festivais. Ainda que por vias tortas, a fama de Panahi só aumentou desde que se tornou conhecido aqui no Brasil pelo seu filme de estreia, O Balão Branco (1995). Seu filme seguinte, O Espelho (1997) também teve apelo por aqui, mas foi O Círculo (2000) que projetou seu nome mundialmente, especialmente por levar para casa o Leão de Ouro no Festival de Veneza. Naquele ano estavam na disputa obras de renomados como Robert Altman (Dr. T e as Mulheres), Stephen Frears (Liam), Manoel de Oliveira (Palavra e Utopia) e novatos ousados como Clara Law (A Deusa de 1967) e João Pedro Rodrigues (O Fantasma), no entanto, o júri ficou impressionado com este retrato da realidade feminina no país do diretor. O filme segue a estrutura justamente o seu título, contando a história de várias personagens a partir de um recorte bastante específico de suas vidas ao longo de um dia. São estas histórias que nos fazem entender ainda mais a cena de abertura, onde uma mulher recebe a notícia sobre o nascimento de um bebê e ao descobrir que nasceu uma menina a tristeza é visível (ao ponto de mencionar que por não ser um menino a mulher poderá ser abandonada). A partir dali a câmera passa seguir outras mulheres que surgem diante da câmera, uma passando o protagonismo com a outra por alguns minutos. Se algumas tem problemas com a polícia, outra sofre rejeição da família, uma precisa lidar com uma gravidez indesejada, outra pretende abandonar a filha enquanto outra está prestes a ser presa por no carro de um homem que não é seu esposo. O roteiro monta um verdadeiro mosaico de histórias em que a opressão à mulher é apresentada de forma direta e crua, embora o diretor tenha grande sensibilidade ao abordar as questões apresentadas. Não há firulas no cinema de Panahi, a fotografia é granulada, a trilha sonora é inexistente, os planos são longos e os cortes precisos. Embora seja composto por histórias tristes, temos a plena noção de que são histórias reais que devem acontecer todos os dias. Se hoje vários filmes buscam retratar a opressão às mulheres e a importância da igualdade entre os gêneros, Jafar Panahi já fazia isso há vinte anos em um cenário bem mais adverso do que a maioria dos cineastas em atividade.
O Círculo (Dayereh / Irã - Itália - Suécia / 2000) de Jafar Panahi com Maryiam Palvin Almani, Nargess Mamizadeh, Mojgan Faramarzi e Monir Arab. ☻☻☻☻
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