Filmes mais modestos como Vidas Sem Rumo (1983) costumam ficar esquecidos na filmografia de Francis Ford Coppola. No entanto, é mais do que compreensível que depois de todo o estresse vivido na produção da obra-prima Apocalypse Now (1979) o diretor se entregasse a produções mais simples como o incompreendido O Fundo do Coração (1981) e esta adaptação do livro de 1967 escrito por S.E. Hinton. A obra de Hinton é reconhecida como um marco na literatura juvenil e influenciou muitos escritores e cineastas ao voltar sua lente para um grupo de jovens marginalizados pela sociedade. Embora o filme tenha feito sucesso modesto na época de seu lançamento, a produção ganhou fama ao longo do tempo por ter revelado um grupo de jovens atores que seria muito falado em Hollywood (e ironicamente o protagonista é o mais esquecido nos dias de hoje). A trama é marcada pela rivalidade de dois grupos distintos, os greasers (ou "usuários de brilhantina" - e o nome não é coincidência, o clássico Nos Tempos da Brilhantina/1978 também bebe na fonte da obra de Hinton, ainda que de forma muito mais branda) e os socs. Os greasers moram na parte pobre da cidade. Tem problemas para pagar as contas, arrumar emprego e geralmente tem problemas com a polícia. Os socs são os "bem nascidos", que andam de carros caros, tem atenção das líderes de torcida, são populares e não tem problema com a falta de dinheiro. Entre estes grupos o protagonista é o greaser Ponyboy (C. Thomas Howell), rapaz que perdeu os pais num acidente e agora vive sob os cuidados do irmão mais velho, Darrell (Patrick Swayze) e do irmão vaidoso Sodapop (Rob Lowe) - e antes que você estranhe, vale mencionar que não se trata de apelidos, mas nomes de verdade. O trio se vira como pode, mas Darrell vive preocupado com o irmão caçula, especialmente por suas companhias. Embora o melhor amigo de Ponyboy seja o melancólico Johnny (Ralph Macchio), a saída de Dallas Winston (Matt Dillon) da prisão, deixa sempre o perigo da contravenção na vizinhança. Fazem parte ainda do grupo o agitado Steve Randle (Tom Cruise, que danificou o dente só para o papel) e o sereno Two-Bit (Emilio Estevez). A coisa se complica a partir de um dia no cinema Drive-In da cidade, em que Ponyboy ganha a atenção da líder de torcida Cherry (Diane Lane) e a rivalidade dos grupos resulta na pior noite de sua vida - e a morte de um personagem muda o rumo da narrativa. Coppola constrói aqui um drama adolescente com cores adultas, especialmente pelo forte comentário social das entrelinhas, assim, apresenta algumas cenas de violência, tentativas de assassinato, mortes, prisões e um julgamento no final que destoa do tom pesadão que o filme recebe em seu penúltimo ato cheio de tragédias. Com fotografia quase sem cores e montagem bem construída, o longa consegue prender a atenção, nem que seja pela curiosidade de ser os astros veteranos novinhos e cheios de vontade de ganhar o mundo. Prova de que o filme funciona é bem cuidado é a cena da briga entre os grupos rivais, um verdadeiro caos de pancadaria, mas filmado com bastante precisão com um grande grupo de atores. Não lembro de um filme que tenha juntado tantos talentos promissores e conduzi-los com tanto equilíbrio. Sem efeitos mirabolantes ou truques narrativos, Vidas Sem Rumo faz emergir a maestria do diretor em conduzir seu elenco. Curiosamente Coppola nunca havia cogitado fazer esta adaptação até que uma professora lhe enviou uma carta explicando que adoraria ver uma adaptação deste seu livro favorito.
Vidas Sem Rumo (The Outsiders / EUA - 1983) de Francis Ford Coppola com C. Thomas Howell, Matt Dillon, Ralph Macchio, Patrick Swayze, Rob Lowe, Tom Cruise, Diane Lane, Emilio Estevez, Tom Waits e Flea. ☻☻☻
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