Hanks e Duncan: milagres no corredor da morte.
"É um filme de prisão, mas é diferente"! Disse minha tia quando assistiu Um Sonho de Liberdade (1994) e acho que este comentário se enquadra perfeitamente em À Espera de Um Milagre (1999). As semelhanças entre os dois filmes não param por aí. Além de serem bem dirigidos por Frank Darabont, eles ainda são baseados em contos do escritor Stephen King - mestre no gênero horror mas que também tem os seus momentos de explorar dramas mais intimistas. Como se não bastasse, os dois foram indicados ao Oscar de Melhor Filme e se fortalecem na parceria entre dois atores (que, por acaso, um é branco e o outro é negro). As semelhanças param por aí, já que Um Sonho de Liberdade é bem realista, enquanto À Espera de Um Milagre possui elementos fantásticos que atraíram muita gente no ano em que O Sexto Sentido (1999) estava na moda. Ambientado no corredor da morte numa penitenciária no ano de 1935, a tranquilidade do ambiente é garantida pelos policiais que pretendem dar um pouco de dignidade aos homens que foram condenados à cadeira elétrica. Os policiais são liderados pelo bom moço Paul Edgecomb (Tom Hanks, quando ainda tinha sua aura de astro intacta após vários sucessos de bilheteria), que consegue ser agradável mesmo com o seu desconfortável problema urinário (que afeta até sua relação com a esposa vivida, pela sempre simpática, Bonnie Hunt). A rotina da penitenciária é apresentada sem pressa, onde conhecemos até a história de um ratinho de circo. A surpresa começa mesmo quando recebem o grandalhão John Coffey (Michael Clarke Duncan em excepcional atuação). Um homem acusado de matar duas meninas e que em momento algum, demonstra ser capaz de uma atrocidade dessas, pelo contrário, trata-se de uma das pessoas mais gentis que já apareceram numa tela. Seu temperamento até infantil mostra-se um paradoxo com seu físico e com as acusações que recaem sobre ele. As dúvidas sobre ter cometido o tal crime só aumentam quando ele demonstra possuir um misterioso poder de curar os doentes que cruzam seu caminho. Um assassino tão brutal seria capaz de ter esse dom? Essa é a pergunta que os personagens se fazem, ao mesmo tempo que a plateia se rende ao prisioneiro gigante. Seu personagem entra em contraste com o sadismo de um policial (um exagerado Doug Hutchinson) e um prisioneiro de fama assombrosa (Sam Rockwell no papel que o tirou do anonimato). Muita gente se incomoda com o fato desses dois personagens serem as únicas figuras desagradáveis no filme - numa construção artificialmente simétrica num filme povoado de personagens tão gentis. No entanto, quem assistiu (e quem não assistiu?) sabe que Darabonts faz um excelente trabalho ao construir uma atmosfera única em seu filme, conseguindo conjugar momentos cômicos e outros de puro horror como as cenas de execução na cadeira elétrica. Abaixo de todos esses elementos existe uma crítica ao sistema carcerário, à própria eficiência da pena de morte e os preconceitos que emergem na condenação desses prisioneiros, mas Darabont prefere valoriza o que sua trama tem de mais diferente nos filmes ambientados numa prisão - o que não deixa de ser um grande risco. É uma tarefa que pode até parecer fácil, mas não é. Emoldurado com bela fotografia e boas atuações, o filme consegue um equilíbrio raro entre esses elementos (e isso em três horas de duração), mas, dificilmente, teria alcançado a projeção em seu lançamento sem a atuação comovente do gigante Michael Clarke Duncan que não deixa seu personagem cair na pieguice em momento algum. Falecido recentemente, é este filme que deixa Duncan imortalizado na história do cinema com um punhado de dor e fantasia.
À Espera de Um Milagre (The Green Mille/EUA-1999) de Frank Darabonts com Tom Hanks, Michael Clarke Duncan, Sam Rockwell, James Cromwell, Bonnie Hunt, Patricia Clarkson, David Morse e Barry Pepper. ☻☻☻☻
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