McAvoy: vinte e três identidades num único corpo.
O cineasta M. Night Shyamalan já foi um dos mais celebrados diretores do final do século XX. O motivo para tantos elogios foi a magnífica repercussão de O Sexto Sentido (1999), filme sobre um garotinho que via gente morta e sua relação com o psicólogo vivido por Bruce Willis. O filme tinha o ritmo lento que só aumentava o suspense e os sustos (sempre que acontecia algo assustador na tela). Econômico, o filme surpreendia a plateia com um final inesperado e que ganhava força quando era visto uma segunda vez e cada detalhe fazia ainda mais sentido. O filme concorreu a 6 Oscars, incluindo melhor filme, Shyamalan concorreu a duas estatuetas (direção e roteiro original) fez mais três filmes interessantes - mas que geraram críticas pelo hábito de se tornar refém de um final "surpresa" e por, aos poucos, banalizar cada vez mais a atmosfera de suas fantasias. Para oxigenar a criatividade, o diretor se concentrou na carreira de produtor, gerando obras instigantes como o filme Demônio/2010 e a série Wayward Pines/2015, além de dirigir filmes que ninguém deu a mínima. Talvez pelo diretor estar em baixa há tanto tempo que o sucesso de Fragmentado se tornou ainda mais bem-vindo. O diretor de origem indiana investe num suspense sobre três adolescentes sequestradas por um sujeito estranho (James McAvoy). Presas num cubículo, as amigas Claire (Haley Lu Richardson) e Marcia (Jessica Aula) percebem que se meteram numa grande armadilha ao lado de uma outra garota, a calada (porém astuta) Casey (Anya Taylor-Joy). Aos poucos o sujeito se mostra ainda mais estranho do que imaginavam, apresentando identidades diferentes e dizendo frases estranhas que só revelam que algo muito pior irá acontecer. Para ajudar o espectador a entender o que está acontecendo, contamos com a Doutora Karen Fletcher (Betty Buckley) que acompanha as peculiaridades do rapaz que ao longo da vida desenvolveu vinte e três identidades específicas por conta de seu Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI), além dela estará cada vez mais preocupada com os e-mails que ele lhe envia toda noite. A Doutora sabe que as identidades de Kevin estão em conflito, mas agora elas parecem agir de um modo diferente, o que talvez possa estar associado ao surgimento de uma vigésima quarta identidade que está prestes a se apresentar. Aos poucos Shyamalan cria um suspense envolvente que caminha para o terror, dando ao escocês James McAvoy momentos memoráveis na pele de Dennis, Patricia, Hedwig, Barry, Orwell, Jade... num universo interessantíssimo sobre a tarefa que tem em mãos (algo como uma versão compacta - devido a duração do filme - do que a excelente Tatiana Maslany faz na série Orphan Black). Não bastasse isso, McAvoy é auxiliado por um ótimo elenco de coadjuvantes, especialmente pela veterana Betty Buckley e a novata Anya Taylor-Joy (se você já se impressionou com a jovem atriz em A Bruxa/2016, aqui ela não decepciona e se concretiza como uma atriz para se ficar de olho). Há quem critique o filme pela forma como aborda o TDI, mas em se tratando de uma obra de ficção de alguém que já contou uma história sobre super-herói onde o vilão tem ossos de vidro, não vejo motivo para maiores polêmicas. Cinematograficamente, a solução entre o conflito da "horda" com Casey pode até ser um tanto simplista (ainda que deixe espaço para uma continuação, ou até duas...), mas nada que tire o brilho de Fragmentado ser a volta por cima de Shyamalan, resta saber qual será o seu próximo passo (e a presença de Bruce Willis numa cena final bastante charmosa pode indicar que o legado do cineasta voltou às origens).
Fragmentado (Split/EUA-2017) de M. Night Shyamalan com James McAvoy, Ania Taylor-Joy, Betty Buckley, Haley Lu Richarson e Jessica Aula. ☻☻☻☻
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